A mata branca em pouco se tornou verde, revigorada, fazendo jus à sua condição de floresta seca mais biodiversa do mundo. Foram os indígenas que primeiro habitaram essa área e deram à Caatinga o nome de “floresta branca”, com origem na língua tupi-guarani. Referiam-se à cor esbranquiçada dos troncos das árvores da Caatinga durante à seca.
Nos períodos secos, as plantas da Caatinga perdem suas folhas, estratégia fisiológica para diminuir a dependência de água antes do auge da escassez de água. Entretanto, quando chegam as chuvas, essa mata branca se transforma em uma paisagem verde, com plantas cheias de folhas e flores.
Esse fenômeno impressionante ocorre em função de as espécies da Caatinga serem altamente adaptadas ao regime de chuvas típico do clima semiárido. As plantas produzem muitas sementes, que ficam depositadas no solo seco, à espera de um volume de água suficiente para brotar. É um mecanismo evolutivo que permite às espécies de gramíneas, cactos ou árvores da Caatinga lidar com a adversidade climática.
No último post, mostramos que quase metade da vegetação original da Caatinga já foi deteriorada pela ação humana, com as principais árvores tendo sido desmatadas ou queimadas. Apenas 8% da vegetação está inserida em unidades de conservação e as políticas de proteção são insuficientes. Além disso, de 15% a 20% do bioma encontra-se em alto grau de degradação ou em processo de desertificação.
Apesar disso, a vegetação da Caatinga possui uma grande capacidade de regeneração. Um mapeamento feito pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), ao monitorar toda a área semiárida do Brasil, incluindo a Caatinga, através de imagens de satélites, analisou o índice da cobertura vegetal do bioma, na última semana de abril de 2019, principal mês da estação chuvosa na região.
Os mapas da vegetação foram processados com imagens do satélite Meteosat-11, com base nas quais calculou-se o índice de vegetação por diferença normalizada (NDVI). O resultado do monitoramento permitiu elaborar uma radiografia da atual condição da cobertura vegetal de todos os estados do Semiárido brasileiro.
Para mais informações sobre a metodologia desenvolvida pelo Lapis, recomendamos a leitura do Livro “Um século de secas”, da Editora Chiado (Portugal). A obra faz uma análise completa das políticas públicas para as secas implementadas no Semiárido brasileiro, durante o período de mais de um século (de 1901 aos dias atuais). Também apresenta resultados do monitoramento da seca e da desertificação em toda a região. Para adquirir a obra, clique aqui.
Confira a seguir a análise da atual cobertura vegetal de cada estado do Semiárido ou do Nordeste brasileiro. Com base nesse monitoramento, é possível subsidiar o planejamento da produção em diversos setores econômicos da região, principalmente a agricultura, pecuária, agroindústria e ecoturismo.
O mapa abaixo permite avaliar a intensidade das chuvas no Brasil, durante o mês de abril. As áreas em verde mostram onde as chuvas acima da média estiveram concentradas, principalmente na região Centro-Sul do País.
Já as áreas em amarelo abrangem grande parte dos estados brasileiros e significam chuvas abaixo da média histórica. A maioria dos estados do Nordeste, da Amazônia e do Oeste da região Sul registraram chuvas nessa intensidade, durante o mês de abril.
O Noroeste da Amazônia, que inclui o estado da Amazônia e de Roraima, e o Leste do Nordeste, notadamente Sergipe, Alagoas e Leste de Pernambuco, na cor laranja, registraram chuvas bem abaixo da média em abril. Nestes locais, foram registrados volumes médios que caracterizam condição de seca, em relação à normal climatológica.
Pelo mapa abaixo, é possível observar que praticamente toda a vegetação da região semiárida brasileira está verde, resultado dos efeitos das chuvas no aumento da umidade dos solos e na recuperação da cobertura vegetal.
Na imagem de satélite abaixo, identifica-se como a vegetação da Caatinga se recuperou nas diferentes áreas do bioma, e quais são as áreas ainda afetadas pela seca em cada estado do Semiárido.
Da área central do estado até o Sertão, alguns municípios continuam secos, conforme mostrado pelas cores vermelha e amarela do mapa. Esses municípios estão inseridos na região do Semiárido brasileiro e pertencem às mesorregiões do Agreste e Sertão.
Por outro lado, a vegetação de todos os municípios do Litoral de Alagoas está completamente verde, desde a área central do estado até a zona litorânea.
Na Bahia, o mapa da vegetação mostra que as mesorregiões do Centro-Norte e do Centro-Sul estão verdes, bem como todo o Vale de São Francisco. Continuam secos apenas municípios do Extremo-Oeste Baiano, do Nordeste Baiano e de parte da área Norte do estado.
Como também ocorreu no ano passado, praticamente todo o estado do Ceará está incrivelmente verde. É o estado atualmente mais verde do Semiárido brasileiro. Dentre os fatores que beneficiaram o Ceará com chuvas este ano, estão: a posição da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), localizada de forma estrategicamente favorável às chuvas no extremo Norte do Nordeste brasileiro.
As bordas dos Vórtices Ciclônicos em Altos Níveis (VCAN’s) também favoreceram, por diversas ocasiões, as chuvas no Ceará, durante o período chuvoso de 2019.
Apenas alguns municípios do Sul Maranhense estão com vegetação moderadamente seca. Por outro lado, a grande maioria dos municípios das demais mesorregiões do estado está com vegetação bastante vigorosa.
Como pode ser observado no mapa acima, da vegetação do Semiárido brasileiro, o Norte de Minas Gerais, que pertence à região, está com vegetação recuperada. Somente alguns municípios da sua área central, em direção ao Oeste, está com cobertura vegetal moderadamente seca.
Os municípios paraibanos localizados na mesorregião do Sertão, parte da Zona da Mata e Litoral do estado estão com vegetação bastante verde.
De acordo com o mapa acima, na área central da Paraíba, há alguns municípios com áreas em vermelho, o que mostra que a seca intensa atinge principalmente as microrregiões dos Cariris paraibanos e do Seridó. Estas áreas são consideradas as mais secas e mais degradadas do Brasil. É onde se encontram dois dos seis núcleos de desertificação do Semiárido brasileiro: Cariris Velhos e Seridó.
A validação da pesquisa e monitoramento por satélite que gerou o Livro “Um século de secas” foi realizada no Núcleo de Desertificação dos Cariris paraibanos e faz um levantamento da classificação dessas áreas da Caatinga já em avançado estágio de deterioração. A metodologia utilizada pode ser aplicada para pesquisas em outras áreas do Semiárido brasileiro.
Em Pernambuco, toda a área da Mata Pernambucana e da Região Metropolitana de Recife está com cobertura vegetal vigorosa.
Os municípios da mesorregião do São Francisco e do Agreste Pernambucano estão com vegetação moderadamente secas. Nestas áreas, somente os municípios mostrados na cor vermelha, no mapa, estão sob condição de seca intensa. Já aqueles que fazem parte do Sertão Pernambucano estão com cobertura vegetal recuperada.
O monitoramento da cobertura vegetal do Piauí mostrou que da área central até o Norte do estado, os municípios estão com vegetação bastante verde. Essa área é beneficiada pela posição da ZCIT, que no período chuvoso deste ano, esteve favorável às chuvas. Já em algumas áreas do Sudoeste e Sudeste piauienses, ainda predomina vegetação moderadamente seca.
O Rio Grande do Norte é também um dos estados da área Norte do Nordeste brasileiro beneficiada pelas chuvas este ano, em função da posição favorável da ZCIT. Por conta disso, a maioria dos municípios está com cobertura vegetal verde.
Somente alguns municípios da mesorregião Central Potiguar e poucos municípios do Leste Potiguar estão com vegetação bastante seca, conforme pode ser observada no mapa, pela intensidade da cor vermelha. Nos demais municípios do estado, predomina vegetação verde.
Sergipe, assim como Alagoas, é o estado que registrou maior período de seca nos últimos meses, principalmente nos municípios inseridos no Semiárido brasileiro.
Pelo mapa acima, observa-se que da parte central ao Oeste do estado (mesorregiões do Agreste e Sertão), a grande maior parte dos municípios permanece sob condição de seca. Já na mesorregião Leste do estado, os municípios estão com vegetação verde, em função de terem sido mais beneficiados pelas chuvas na área Litorânea.
Conservar a Caatinga e a sua biodiversidade ainda preservada são as estratégias mais efetivas para impulsionar a economia do bioma, de forma sustentável. Há uma forte relação entre floresta, água e clima, especialmente no Semiárido brasileiro, onde a conservação florestal está intimamente ligada à disponibilidade hídrica. É a Caatinga protegida que mantém as nascentes e os rios perenes por mais tempo.
A floresta da Caatinga adapta-se às secas cada vez mais frequentes e intensas. Mas é preciso utilizar seus recursos naturais de forma mais sustentável, evitando o aumento da desertificação. O monitoramento da Caatinga, através de imagens de satélites, pode contribuir para um planejamento mais adequado para o uso sustentável das potencialidades naturais do bioma.
Como está a cobertura vegetal do seu município? Gostaríamos do seu comentário.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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