Cerca de 40% da cobertura vegetal do Brasil se tornaram degradadas, somente no período 2001-2021. Por outro lado, houve um crescimento de 33% de cobertura vegetal agrícola, situadas em áreas da Amazônia, Centro-Oeste, parte do Sudeste e Sul do País. É o que mostra o resultado de um recente Relatório de monitoramento por satélite, realizado pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis).
De acordo com o levantamento, grande parte das áreas degradadas estão situadas no Semiárido brasileiro, na Amazônia e em áreas da região Sudeste do País. O meteorologista Humberto Barbosa, responsável pela pesquisa, alerta que a redução nas chuvas na região Centro-Norte do Brasil foi crítica, nas últimas duas décadas, aumentando as pressões humanas sobre a biomassa vegetal dessas áreas.
O pesquisador explica que, associado à questão climática, como é o caso de uma maior frequência dos eventos extremos de seca, houve aumento do desmatamento e dos incêndios florestais. Esses fatores explicam a velocidade de degradação da vegetação nessas áreas.
O Relatório do Lapis também mostra que somente no período 2018-2020, o Brasil perdeu 1,6% de cobertura florestal, correspondendo a 12,9 Milhões de hectares (Mha). No levantamento, foram desenvolvidos três tipos diferentes de produtos de satélites, para monitoramento dos principais vetores da degradação ambiental no Brasil.
O mapeamento incluiu análises de tendências como índices de queimadas, precipitação e biomassa vegetal, importantes para estimar os principais fatores de degradação, no território brasileiro.
Neste post, vamos apresentar os resultados desse mapeamento, com destaque para os tipos de dados de satélites utilizados, para calcular a tendência de cada variável. Os dados alertam para a alta velocidade da degradação no território brasileiro.
De acordo com o Relatório especial sobre degradação das terras, do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), a degradação da terra é definida como uma tendência negativa na condição da terra, causada por processos humanos induzidos, expressa como redução de longo prazo e como perda de pelo menos um dos seguintes fatores: produtividade biológica, integridade ecológica ou valor para os seres humanos.
Assim, a diminuição da biomassa, pela perda da cobertura vegetal ou pela mudança no uso da terra, a erosão do solo e os incêndios florestais estão entre algumas das atividades que provocam degradação.
O relatório também trata do verdejamento da vegetação, definido como “um aumento da biomassa das plantas fotossinteticamente ativa, inferido a partir de observações de satélite. Já o escurecimento da vegetação é “uma diminuição da biomassa das plantas fotossinteticamente ativa, inferida a partir de observações de satélite”.
Uma pesquisa recentemente publicada identificou que áreas áridas já existentes no Nordeste brasileiro têm reduzido as nuvens de chuva. As secas e a degradação severa das terras já causam aridez atmosférica. É um processo que se retroalimenta: as secas aumentam os processos de degradação das terras que, por sua vez, já impactam na redução das nuvens de chuva. Acesse este post e saiba mais sobre a pesquisa.
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O mapa acima mostra áreas onde houve crescimento e perda da cobertura vegetal. As áreas em roxo, concentradas no Semiárido brasileiro, além de áreas da Amazônia, Sudeste e Centro-Oeste brasileiro, destacam onde houve redução na cobertura vegetal no Brasil. O mapa foi elaborado a partir do cálculo do índice de biomassa, que estima o desenvolvimento da cobertura vegetal nas regiões, no período 2001-2021.
As áreas com redução da cobertura vegetal mostram onde houve aumento da degradação. De acordo com o mapa da biomassa, nas últimas duas décadas, houve diminuição de 326,78 milhões de hectares (39%) de biomassa e 276,45 milhões de hectares (33%) de ganho de cobertura vegetal, no território brasileiro.
A área total que apresenta algum tipo de cobertura vegetal no Brasil corresponde a 837,82 milhões de hectares. Isso em relação à área total do território brasileiro, que é de 851,83 milhões de hectares.
Mas apesar de o mapeamento mostrar aumento da biomassa vegetal no Brasil, o pesquisador Humberto Barbosa, do Laboratório Lapis, ressalta que esse crescimento de 33% da área da cobertura vegetal se deve à expansão das áreas agrícolas. Paralelo a isso, como mostrado acima, a redução das chuvas, o desmatamento e os incêndios florestais têm aumentando a degradação em outras áreas do País.
Recentemente, Humberto coordenou uma pesquisa internacional sobre a Amazônia. Os resultados do estudo mostraram que cerca de 757 mil km2 da bacia amazônica tornou-se terra degradada, o que corresponde a uma estimativa de 12,5% do total, nas últimas duas décadas. O principal fator de degradação identificado foi o desmatamento, intensificado pela seca. Acesse aqui o post completo sobre a pesquisa.
O método utilizado para gerar esse mapa foi consolidado em pesquisas do Laboratório Lapis, cujos resultados são apresentados neste artigo, do professor Humberto Barbosa. O método combina cálculos de tendências de séries temporais do Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) anual, com dados do produto MODIS MOD13Q1 v6, com resolução de 250m e regressão linear.
A tendência também é classificada considerando-se as mudanças no desempenho temporal da cobertura vegetal (estabelecendo-se uma linha de base de 20 anos e comparando-se com o estado atual), além do valor inicial da biomassa.
O levantamento do Laboratório Lapis ainda detalhou os dados de degradação da vegetação no Nordeste brasileiro, nas últimas duas décadas. O mapa abaixo apresenta como a produtividade da vegetação se apresentou, no período, com registro de degradação de 51% da sua biomassa vegetal.
Do total de áreas degradadas, no período, houve degradação intensa em 27% da cobertura vegetal da região (áreas em rosa, no mapa), enquanto 24% da sua área sofreu baixa perda de biomassa. Por outro lado, houve ganho de 23% de biomassa (áreas em verde, no mapa) e 26% da área não sofreu mudanças significativas, durante o período. A perda de floresta no Nordeste foi de 3,68%, equivalente a 0,52 Mha, no período 2018-2020.
No gráfico a seguir, apresentamos os resultados do mapeamento do ganho ou perda da cobertura vegetal, de acordo com os dados de cada estado do Nordeste brasileiro. A cor magenta (rosa) apresenta as áreas degradadas na região, incluindo a junção da alta e baixa perda da cobertura vegetal.
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O mapeamento do Laboratório Lapis também apresentou os dados de degradação da vegetação no Sul do Brasil, nas últimas duas décadas. De acordo com o mapa acima, no período 2001-2021, cerca de 26% da cobertura vegetal da região foi degradada. O registro de perda de biomassa inclui condições de alta e de baixa degradação da cobertura vegetal.
Por outro lado, cerca de 50% da cobertura vegetal da região permaneceu estável, enquanto houve ganho de 24% de cobertura vegetal, caracterizada geralmente por agricultura e pastagem.
O mapeamento estimou ainda a perda de floresta no Sul brasileiro. No período 2018-2020, houve perda de 1,47% de floresta, equivalente a 0,20 Mha.
No gráfico a seguir, apresentamos os resultados do mapeamento do ganho ou perda da cobertura vegetal, de acordo com os dados de cada estado do Sul brasileiro. A cor magenta (rosa) apresenta as áreas degradadas na região, durante o período, enquanto a cor verde mostra o ganho de cobertura vegetal.
O mapeamento realizado pelo Lapis também apresentou os dados de degradação da vegetação no Sudeste brasileiro, nas últimas duas décadas. O mapa acima apresenta como a produtividade da vegetação se apresentou, no período, com registro de degradação de 24% da sua biomassa vegetal.
Do total de áreas degradadas no Sudeste, durante o período, houve registro de degradação intensa de 18% da cobertura vegetal da região (áreas em magenta, no mapa), enquanto 6% da sua área sofreu baixa perda de biomassa. Por outro lado, houve ganho de 35% de biomassa (áreas em verde, no mapa) e 41% da área não sofreu mudanças significativas. Já a perda de floresta na região foi estimada em 1%, equivalente a 0,29 Mha, no período 2018-2020.
Observa-se que os dados de degradação na região Sudeste se aproximam com os números da região Sul. Porém, o ganho de cobertura vegetal foi significativamente maior no Sudeste (35%). Geralmente, esse aumento da produtividade da biomassa se dá em razão do aumento das áreas agrícolas ou de pastagens.
No gráfico a seguir, apresentamos os resultados do mapeamento do ganho ou perda da cobertura vegetal, de acordo com os dados de cada estado do Sudeste brasileiro. A cor magenta (rosa) apresenta as áreas degradadas na região, incluindo a junção da alta e baixa perda da cobertura vegetal.
Os dados do levantamento do Laboratório Lapis mostram a degradação da vegetação no Centro-Oeste brasileiro, nas últimas duas décadas. De acordo com o mapa acima, no período 2001-2021, cerca de 21% da cobertura vegetal da região foi degradada. O registro de perda de biomassa inclui condições de alta e de baixa degradação da cobertura vegetal.
Por outro lado, cerca de 47% da cobertura vegetal do Centro-Oeste permaneceu estável, enquanto houve ganho de 32% de cobertura vegetal. É importante ressaltar, mais uma vez, que o ganho de biomassa na região geralmente é caracterizado pelo crescimento de áreas com agricultura e pastagem.
O mapeamento estimou ainda a perda de floresta no Centro-Oeste brasileiro. No período 2018-2020, houve perda de 1,16% de floresta, equivalente a 0,68 Mha.
No gráfico a seguir, apresentamos os resultados do mapeamento do ganho ou perda da cobertura vegetal, de acordo com os dados de cada estado do Centro-Oeste brasileiro. A cor magenta (rosa) apresenta as áreas degradadas na região, durante o período, enquanto a cor verde mostra o ganho de cobertura vegetal.
O mapeamento da degradação no Brasil, nas últimas duas décadas, feito pelo Laboratório Lapis, foi concluído com os dados sobre a degradação na região Norte, que inclui grande parte da floresta amazônica.
De acordo com o mapa acima, no período 2001-2021, cerca de 24% da cobertura vegetal da região foi degradada. Desse percentual de perda, cerca de 20% se constituem em condições de alta degradação da cobertura vegetal.
Embora tenha havido um ganho de 30% de biomassa na Amazônia, durante o período, esse crescimento se deve à expansão agropecuária, sobretudo pela substituição de extensas florestas contínuas por pastagens no arco do desmatamento.
Nessas áreas, a principal causa do desmatamento é para dar lugar à pecuária extensiva. As queimadas são largamente utilizadas para a abertura de novos pastos, visando expandir a criação de gado.
O mapeamento do Lapis também estimou a perda de floresta na região Norte do Brasil. No período 2018-2020, houve perda de 1,41% de floresta, equivalente a 0,21 Mha.
No gráfico acima, apresentamos os resultados do mapeamento do ganho ou perda da cobertura vegetal, de acordo com os dados de cada estado do Centro-Oeste brasileiro. A cor magenta (rosa) apresenta as áreas degradadas na região, durante o período, enquanto a cor verde mostra o ganho de cobertura vegetal.
O Laboratório Lapis também realizou o mapeamento das áreas de recorrência de incêndios florestais no País, no período 2001-2021. O destaque do mapa é a intensificação da recorrência de queima da vegetação em Matopiba, nova fronteira agrícola do Brasil. O centro-Oeste também é uma área onde houve maior frequência de incêndios florestais, durante o período. Essas áreas estão destacadas em amarelo, laranja e roxo, no mapa, com exceção da delimitação de Alagoas, onde o roxo é apenas a delimitação do mapa político do estado.
A elevação das temperaturas e da frequência de secas tornaram os incêndios florestais mais recorrentes, disseminados, graves e com efeitos biológicos que modificam o tipo de cobertura vegetal. Esses fatores afetam a diversidade das espécies, levando à perda da biomassa e à erosão do solo. O fogo é amplamente utilizado para limpeza de terras de áreas cultivadas, com impacto direto nas emissões de gases de efeito estufa.
O Laboratório Lapis avaliou a recorrência de focos de incêndio, em escala anual, para o período 2001-2021. O índice de recorrência do fogo foi calculado a partir do número de eventos de queimadas (anos em que estava queimando), dividido pela série temporal, neste caso, por 21 anos.
No mapa, valores próximos do numeral 1 indicam o registro de pelo menos um evento de queimada, para todos os anos, e valores de 0,1 indicam registro de um evento de queimada, a cada 10 anos. No território brasileiro, algumas áreas com maior frequência de incêndios estão associadas à biomassa em declínio, ou seja, à perda da cobertura vegetal.
O índice foi calculado usando dados do Fire Information for Resource Management System (FIRMS), do banco de dados da Nasa e o produto de área queimada MCD64A1, versão 6 (MODIS Terra e Aqua), combinando dados da Área Queimada mensalmente e grade global de 500m.
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A consideração de dados climáticos, como a história recente da tendência de precipitação, contribui para uma melhor compreensão dos fatores que impulsionam a perda ou o aumento da cobertura vegetal no Brasil. Também é um dado importante para planejar a necessidade de adaptação ao clima, sobretudo no atual contexto de aumento dos eventos extremos.
O mapa da tendência de precipitação anual, durante o período 2000-2020, foi gerado a partir do monitoramento por satélite, do Laboratório Lapis. Os dados foram estimados por um índice que representa o nível de concordância entre três bases de dados globais: TerraClimate, ERA5 e Global Precipitation Mission (GPM).
As tendências de chuva, no território brasileiro, foram calculadas sobre a precipitação total anual, usando um Teste de Mann-Kendall, para cada produto, e classificando o resultado como negativo, positivo ou não significativo (estável).
Os três mapas resultantes foram combinados para mostrar áreas de concordância, que geram um nível mais alto de confiança. O resultado do mapeamento mostra tendências de redução e aumento das chuvas, a partir da distribuição espacial da precipitação, ao longo das duas décadas analisadas.
O marrom mostra áreas com redução de chuvas, nas últimas duas décadas, que compreendem grande parte do Brasil, inclusive regiões com forte vocação para a agricultura. Já os tons de azul mostra a tendência de aumento da chuva, que se restringe a áreas muito pontuais da Amazônia. As áreas na cor creme mostram estabilidade nos volumes de chuva, em relação à média histórica.
No mapa, destaca-se uma alta proporção de área com redução de chuvas. Esse dado contribui para compreender a diminuição das chuvas como mais um dos vetores de degradação, permitindo a separação entre as forças induzidas pelo clima ou a degradação da vegetação pela ação humana.
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Uma evidência curiosa foi encontrada no levantamento feito pelo Laboratório Lapis, sobre a degradação da vegetação em todo o território brasileiro. É que o estudo não se deteve apenas no mapeamento da perda da vegetação, nas últimas duas décadas, nas regiões brasileiras. Também foram analisadas as áreas que mais foram expostas a queimadas e onde houve redução nos níveis de precipitação, no mesmo período.
Certamente não é uma mera coincidência. Compare os três mapas. Você vai observar que os locais onde houve maior perda da vegetação por desmatamento e maior incidência de queimadas, no período, foi justamente onde se registrou uma redução histórica nos volumes de precipitação.
Vale lembrar que o aumento na frequência e intensidade das secas, decorrente dos eventos climáticos extremos, têm elevado os impactos de degradação da vegetação, no território brasileiro.
Desse processo, expandem-se as áreas em desertificação no Semiárido brasileiro, enquanto a savanização ocorre na Amazônia. A desertificação ocorre quando as terras são degradadas de forma grave ou muito grave, em áreas, semiáridas ou subúmidas secas.
Já a savanização é o processo irreversível de transformação de áreas ocupadas por densa vegetação em desertos parciais, tendo como principal agente a ação humana, especialmente na Amazônia.
O conteúdo deste post foi aprofundado no Livro "Um século de secas", a obra mais completa para entender a região do Semiárido brasileiro.
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*Atualizado em: 06.05.2023, às 08h31.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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