O monitoramento da seca, a partir do uso de índices, é uma conquista recente. Com uso de mapas e séries temporais, baseados no processamento de dados de satélites, é possível desenvolver um sistema de acompanhamento das características das secas.
O objetivo desses índices é quantificar os aspectos climatológicos, entender sua frequência e severidade, fundamentais à tomada de decisão, em todos os setores econômicos e sociais.
Esse tipo de informação tem se tornado cada vez mais crucial, em um cenário de mudanças climáticas, que tem como uma das consequências o aumento da severidade, abrangência e duração das secas.
No período de 2020 a 2021, a região do Centro-Sul brasileiro, onde predomina a produção de commodities agrícolas para exportação, foi drasticamente afetada por uma das secas mais intensas, nos últimos 70 anos.
Isso ocorreu pouco tempo depois de o Semiárido brasileiro enfrentar a pior seca da sua história, com duração de 2011 a 2017, sem precedentes nos registros científicos de até então.
Especialistas e segmentos da sociedade civil afirmam que foi uma das décadas mais desafiadoras do Nordeste brasileiro, cuja base da economia é a agricultura familiar.
E o que agravou ainda mais a situação é que, mesmo depois do fim dessa grande seca, de 2017 para cá, os índices pluviométricos se mantiveram abaixo da média na região.
De acordo com o meteorologista Humberto Barbosa, do Laboratório de Análise e Processamento de Satélites (Lapis), a recente volta do La Niña e a previsão de águas mais aquecidas no Atlântico Sul trazem um cenário de previsão mais favorável às chuvas no Nordeste, durante o próximo verão.
O Laboratório Lapis utiliza um conjunto de indicadores para monitorar, semanalmente, a condição da seca em todo o Brasil, bem como as áreas que receberam maiores volumes de chuva.
Esses índices são apresentados em forma de mapas, como o da cobertura vegetal, da umidade do solo, da precipitação, entre outros. Neste post, iremos destacar alguns desses indicadores.
>> Leia também: Como é gerada a imagem de NDVI para todo o Brasil?
Um dos índices utilizados para o monitoramento das secas é o popular Índice de Vegetação de Diferença Normalizada (NDVI), baseado em dados de satélites. Esse índice permite monitorar, quantificar e investigar impactos das secas na vegetação, em resposta a fenômenos climáticos.
Uma das vantagens é que a aplicação desse índice de vegetação permite detectar a seca, ainda em sua fase inicial. Pesquisas comprovaram a eficiência do NDVI, para monitoramento da seca, a partir da comparação com indicadores de precipitação e de umidade do solo.
Um artigo recente, publicado pela equipe do Laboratório Lapis, no periódico Remote Sensing, destacou a expansão das secas pela bacia do rio São Francisco, de 1980 até o presente.
As secas intensas costumavam se concentrar no Baixo São Francisco, mas nos últimos anos, passaram a atingir o Médio e Alto Sao Francisco. Veja o uso do indicador de NDVI, naquela bacia hidrográfica, na imagem de satélite que abre este post. Acesse aqui o post completo sobre a pesquisa.
O mapa acima, elaborado no QGIS, a partir do cálculo do NDVI, mostra a atual condição da cobertura vegetal, em todas as regiões brasileiras.
As áreas em vermelho indicam que a saúde da vegetação foi afetada, pela condição de seca intensa e baixa umidade do solo. Essa condição abrange, atualmente, quase todo o Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste, além de Tocantins e do norte do Paraná.
>> Leia também: O La Niña voltou. Saiba qual será a influência no clima brasileiro
Outro indicador utilizado é o Índice de Precipitação Padronizado (SPI), baseado em dados CHIRPS, coletados por satélites e em estações na superfície terrestre.
Calculado no software QGIS, o mapa de SPI permite fazer uma verdadeira radiografia da atual condição de seca, nas regiões brasileiras, bem como das áreas que receberam volumes significativos de precipitação.
De acordo com o mapa de SPI, no período de 11 a 20 de outubro, houve melhoria nos volumes de chuvas no Sudeste do Brasil, além de Goiás, Tocantins, Maranhão e parte do Pará (áreas em azul ou roxo).
No oeste do País, estiagem moderada ou fraca (áreas em bege e amarelo) atingiu áreas da Amazônia, Mato Grosso, Rondônia e Acre. Também ocorreu seca moderada nas áreas que vão de Pernambuco ao nordeste da Bahia, bem como do leste do Paraná ao leste do Rio Grande do Sul.
Nas demais áreas (destacadas em branco no mapa), houve predomínio de chuvas em torno da média esperada, para o período.
>> Leia também: Seca se expandiu pela bacia do São Francisco nas últimas décadas
Como estava a condição da umidade do solo, no Semiárido brasileiro, nesse mesmo período de 2019 e 2020? O mapa da umidade do solo, elaborado pelo Laboratório Lapis, a partir de dados de satélite, destaca a diferença na atual condição de seca no solo, em comparação com a primeira semana de outubro, dos anos de 2019 e 2020.
Os mapas acima permitem observar, que o início de outubro de 2021 está bem mais seco, em relação ao começo de outubro de 2019 e 2020. Hoje, a extensão da seca abrange toda a região do Semiárido brasileiro.
Pelas áreas em vermelho, é possível perceber que nesse mesmo período de 2019, a seca tinha atingido uma área menor na região. A diferença também é possível perceber no percentual de umidade do solo, ou seja, na quantidade de água contida no solo, que está bem mais crítica no mapa deste ano.
A estiagem em 2021 continua intensa, em todos os municípios do Nordeste brasileiro. É o que mostra o mapeamento semanal, feito pelo Lapis, a partir de imagens de satélites.
As imagens abaixo são do sensor MIRAS (desenvolvido para estimar a emissão de micro-ondas, da superfície da Terra), a bordo do satélite Soil Moisture Ocean Salinity (SMOS), da Agência Espacial Europeia (ESA).
A seca fica mais evidente quando comparamos as três imagens. A diferença é tanta que pode ser vista desde o espaço. Olhando a imagem atual, quase todo o Semiárido brasileiro apresenta valores de umidade no solo inferiores a 10% (ou ponto de murcha, quando não há água suficiente no solo, para a vegetação absorver os nutrientes), em relação a outubro de 2019 e 2020.
O efeito do retorno La Niña deve minimizar a atual situação de seca, nos próximos meses. Até a chegada das chuvas, que deve ocorrer só em novembro, no oeste/noroeste da região Nordeste (parte da região de Matopiba), uma medida que pode vir a mitigar os efeitos da estiagem é a instalação de sistemas de irrigação nas propriedades rurais.
Nas demais áreas do Semiárido, as chuvas chegam somente a partir de fevereiro, que é o início do período chuvoso na região.
>> Leia também: Os 7 elementos para classificar o uso e ocupação do solo em imagens de satélites
Se você quer desenvolver indicadores, com uso de Sistema de Informação Geográfica (SIG), para a sua carreira, projeto acadêmico ou prestação de serviços, o Laboratório Lapis desenvolveu um método para gerar mapas, processar e analisar imagens, no software QGIS.
O método do Lapis abrange desde o básico até o nível avançado, no QGIS. Para assistir à apresentação do prof. Humberto Barbosa, fundador do Lapis, sobre os 4 pilares do método, clique aqui.
O Livro “Um século de secas” utilizou um conjunto de indicadores, imagens de satélites e séries temporais para avaliar a pior seca do século, além das secas ocorridas no Semiárido brasileiro e políticas de adaptação, durante mais de 100 anos.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
Copyright © 2017-2024 Letras Ambientais | Todos os direitos reservados | Política de privacidade