O Brasil possui mais de 5 milhões de estabelecimentos rurais. Foi o que mostrou o novo Censo Agropecuário brasileiro, cujos resultados definitivos foram divulgados no último mês de outubro, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A pesquisa fez uma radiografia da zona rural brasileira, com dados relativos ao período de 1º de outubro de 2016 a 30 de setembro de 2017. O Censo Agropecuário vem sendo realizado a cada dez anos. As últimas informações disponíveis remontavam a 2006.
Foram visitados, para o último levantamento, um total de 7,5 milhões de endereços, num trajeto dos recenseadores que somou 5,5 milhões de quilômetros de extensão. A coleta de dados ocorreu no período de 1º de outubro de 2017 a 28 de fevereiro de 2018.
Os estabelecimentos agropecuários ocupam cerca de 41% da área total do País. Em relação ao levantamento anterior, feito em 2006, houve um aumento de quase 6% na área ocupada, apesar da redução de cerca de 102 mil unidades rurais.
Neste post, selecionamos os 7 principais fatos revelados pelo Censo Agropecuário 2017 sobre a atual realidade desse setor econômico no Brasil.
A participação de mulheres na direção de estabelecimentos agropecuários aumentou, no período de 2006 a 2017. De acordo com o novo Censo, são 946 mil mulheres que trabalham em atividades agropecuárias. O número representa 19% do total de 5 milhões de produtores rurais, superando os 13% registrados em 2006.
O Censo Agro 2017 também pesquisou, pela primeira vez, o compartilhamento de direção nos estabelecimentos rurais. A conclusão foi que 817 mil mulheres participam da direção do estabelecimento rural, de forma compartilhada com o cônjuge. São mais de 1 milhão de unidades compartilhadas pelo casal, o que representa 20% do total.
Assim, não apenas aumentou a presença das mulheres na direção diretamente dos estabelecimentos agropecuários. O Censo registrou o protagonismo dessas mulheres rurais na direção compartilhada. Apesar de a presença feminina ter aumentado na agropecuária, especialistas ainda consideram o percentual baixo.
Segundo o IBGE, não é que as atividades rurais estejam atraindo mais mulheres. É uma substituição de comando por vários fatores, como envelhecimento, falecimento, aposentadorias. Em outros casos, o marido teve que buscar outra atividade para manter a família e, em sua ausência, as mulheres assumiram a direção do estabelecimento.
A Bahia é o estado com o maior número de mulheres que assumiram a direção de um estabelecimento agropecuário, tornando-se empreendedoras no campo. Ao aplicarem novas técnicas no estabelecimento, muitas delas conseguiram inclusive aumentar a produtividade.
Nos últimos 11 anos, a mecanização influenciou na diminuição da mão de obra no setor agropecuário. De acordo com o novo Censo Agropecuário, durante o período 2006-2017, o setor perdeu cerca de 1,5 milhão de trabalhadores. Por outro lado, o número de estabelecimentos com tratores aumentou 50%, em relação ao último Censo, realizado em 2006.
O pessoal ocupado nos estabelecimentos agrícolas diminuiu quase 9%, indo de 16,5 milhões de pessoas, em 2006, para 15 milhões, em 2017. Esse número inclui a redução de 2,2 milhões de trabalhadores na agricultura familiar e o aumento de 703 mil no agronegócio.
O IBGE observou na pesquisa que o processo de mecanização é crescente e contínuo na agropecuária, seguindo uma tendência que ocorre em outros setores da economia. Com o aumento na automação, diminui o número de trabalhadores ocupados na produção.
Diante da substituição da mão de obra pelas máquinas agrícolas, a alternativa aos trabalhadores do campo é buscarem qualificação para operar a maquinaria.
O crescimento do uso de tecnologias no campo, aliado a pesquisas de melhoria genética, também tornou possível o aumento da produtividade das safras.
A pesquisa do IBGE evidenciou que não houve necessidade de aumentar a área de colheita no mesmo ritmo de crescimento da produção de grãos. Um exemplo é a soja, cujo volume de produção mais que dobrou, crescendo 123%, entre 2006 e 2017, enquanto sua área de colheita aumentou somente 72%.
Dados do Censo Agropecuário 2017 apontam uma redução de 9,5% no número de estabelecimentos rurais ligados à agricultura familiar, em relação ao último Censo, de 2006.
De acordo com a pesquisa, o segmento da agricultura familiar também foi o único a perder mão de obra, estimada em um contingente de 2,2 milhões de trabalhadores.
Já no agronegócio, houve a criação de 702 mil postos de trabalho. Novos estabelecimentos foram incorporados ao processo produtivo, principalmente no Norte e Centro-Oeste, regiões de fronteiras agrícolas.
No Nordeste, houve a redução de estabelecimentos e de área de lavoura. Segundo o IBGE, o encolhimento da agricultura familiar pode ter sido ocasionado pelo envelhecimento do produtor, sem haver substituição pelas novas gerações, e pela seca intensa que ocorreu no período anterior ao Censo, que fez com que as pessoas acabassem abandonando os seus estabelecimentos.
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A agricultura familiar exerce um papel fundamental no suprimento de alimentos para a população brasileira. Um total de 70% dos alimentos consumidos são provenientes da produção de pequenos agricultores.
Eles plantam e criam rebanhos para o autoconsumo das suas famílias e costumam vender o excedente da produção, contribuindo para a diversidade de alimentos no País.
É importante esclarecer que a produção da agricultura familiar praticamente se manteve, mesmo diante de algumas adversidades, principalmente climáticas, durante o período da pesquisa. O que houve, na realidade, foi uma mudança na legislação que fez com que os números da agricultura familiar encolhessem no novo Censo Agropecuário.
Pelos critérios da Lei no 11.326/2006, se a força de trabalho da própria família já não é predominante nas atividades econômicas do estabelecimento rural, a unidade não poderá ser classificada como de agricultura familiar.
O novo Censo identificou uma tendência de redução da mão de obra familiar nos estabelecimentos agropecuários. O produtor que possui uma pequena propriedade rural tem buscado mão de obra fora do seu estabelecimento e a gestão já não é estritamente familiar.
Um dos fatores dessa mudança de configuração é a falta de fixação dos jovens rurais para colaborar diretamente nas atividades rurais.
O IBGE esclarece que não houve mudança no perfil dos agricultores familiares, mas foram as mudanças nos critérios da legislação, para o enquadramento nessa categoria, que levaram a uma diminuição da modalidade. A exigência é de que pelo menos metade da renda do produtor tenha origem rural e a mão de obra da família corresponda a mais da metade do total no estabelecimento.
Assim, em 2017, dos 4,6 milhões de estabelecimentos de pequeno porte que poderiam ser classificados como de agricultura familiar, apenas 3,9 milhões atenderam a todos os critérios. Na prática, a perda de espaço da agricultura familiar ocorreu mais nas novas fronteiras agrícolas, como na região do Matopiba.
Mesmo assim, a agricultura familiar continua representando o maior contingente (77%) dos estabelecimentos agrícolas do País. O Censo mostra que a agricultura familiar resiste à forte demanda internacional por commodities, que estimula a concentração de terras e a monocultura.
O Censo revelou a manutenção de 80 milhões de hectares, com mais de 10 milhões de pessoas ocupadas de perfil familiar. Do total de estabelecimentos agropecuários do País, 3,8 milhões foram classificados como de agricultura familiar, sendo responsáveis por 23% do valor da produção nacional.
Porém, por serem de pequeno porte, a agricultura familiar ocupa uma área menor, equivalente a apenas 23% da área agrícola total do País, em comparação aos grandes estabelecimentos, responsáveis pela produção de commodities agrícolas de exportação, como soja e milho.
No Censo de 2006, a agricultura familiar respondia por 85% dos estabelecimentos agropecuários, com um total de 4,3 milhões deles.
Nos últimos 11 anos, o número de estabelecimentos que admitiram usar agrotóxicos aumentou mais de 20%, de acordo com o Censo Agro 2017. Pelo menos 35% dos produtores entrevistados afirmaram utilizar agrotóxicos em seus estabelecimentos, enquanto 65% negou usar o produto.
A pesquisa também mostrou o elevado número de analfabetos que aplicaram esse tipo de produto nas áreas rurais, sem receberem nenhum tipo de assistência técnica.
De acordo com a pesquisa, 15% dos produtores que utilizaram agrotóxicos não sabiam ler e escrever. Desse total, quase 90% declararam não ter recebido qualquer tipo de orientação técnica quanto à utilização dos produtos.
Em relação aos estabelecimentos que declararam utilizar agrotóxicos, 73% possuíam menos de 20 hectares de área de lavouras. A despesa com esse tipo de produto é significativamente maior nas médias e grandes concentrações de terra.
Dos 32 bilhões de reais de despesas com agrotóxicos, apenas 7% são de estabelecimentos de pequeno porte. Isso reforça a importância dos pequenos estabelecimentos rurais na produção de alimentos mais saudáveis.
Outro dado apresentado pelo novo Censo Agropecuário é o envelhecimento da população rural. O percentual de produtores com mais de 65 anos aumentou de 18% para 23%, nos últimos 11 anos. Já o de produtores com idades entre 25 e 35 anos caiu de 14% para 10%.
Até aqui, o dado acompanha uma tendência demográfica da população brasileira. O problema é que, com o envelhecimento dos chefes ou das chefes de família, não tem havido a sucessão deles, pelas novas gerações, nas atividades rurais.
Os filhos têm optado por outras atividades, fora do domicílio agrícola. Assim, a população rural está ficando idosa e o número de pessoas ocupadas nos estabelecimentos está diminuindo. Além disso, tem havido o aumento da mecanização e da contratação de serviços.
Pela primeira vez, o Censo Agropecuário investigou a cor ou raça dos mais de 5 milhões de produtores agrícolas do País. Em 2017, um total de 53% deles eram negros ou pardos, enquanto 45% eram brancos.
Apesar desse percentual, a disparidade é enorme na distribuição da área dos estabelecimentos agropecuários. A população de negros ou pardos é minoria na direção de grandes estabelecimentos agrícolas.
A proporção se inverte, conforme aumenta o tamanho da área de produção. Entre os produtores que dirigem propriedades com até cinco hectares, a população negra ou parda é maioria, com 65%, contra 32% de brancos.
Já nas grandes áreas, a disparidade se intensifica. Em estabelecimentos agropecuários de mil a 10 mil hectares, há mais que o triplo de brancos na direção (75%), face aos negros ou pardos (24%). Na última faixa estabelecida pela pesquisa, de mais de 10 mil hectares, a proporção é de 80% contra 19%.
Os 5 milhões de estabelecimentos rurais agropecuários correspondem a mais de 351 milhões de hectares. Em relação ao uso da terra, entre 2006 e 2017, observou-se que 29% da área total dos estabelecimentos agropecuários é formada por matas e florestas, enquanto 18% é dedicada a lavouras.
O uso da terra predominante, de acordo com o novo Censo Agropecuário, é de pastagens, que abrange 45% da área total dos estabelecimentos. Isto mostra que a pecuária é a principal atividade econômica nos estabelecimentos rurais.
A ilustração, a seguir, mostra a ocupação e uso da terra de cada região brasileira, em relação às unidades de conservação, terras indígenas e estabelecimentos agropecuários.
Em 11 anos, observou-se redução de 38% na área utilizada para lavouras permanentes, como frutas e café, por exemplo. Já a área destinada a lavouras temporárias, como grãos e cana de açúcar, cresceu 13%.
Houve, também, redução de 19% nas áreas de pastagem natural, e crescimento de 9% nas áreas destinadas a pastagens plantadas. O Censo mostra, ainda, elevação da quantidade de hectares destinados a matas naturais (11%), que são as florestas naturais, e plantadas (79%), que são as áreas destinadas a silvicultura.
A nova radiografia da agropecuária brasileira, feita pelo Censo Agro 2017, do IBGE, mostra profundas transformações no perfil desse setor econômico no País. Uma delas é a tendência à mecanização e automação da produção, com uso de tecnologias para agricultura 4.0, que apresenta enormes desafios às políticas e à capacitação dos trabalhadores do campo.
Além disso, um efeito colateral do crescimento do agronegócio tem sido o aumento do uso de agrotóxicos, nos estabelecimentos rurais, representando uma ameaça à saúde pública.
A presença de grupos minoritários, como mulheres, negros e pardos, no empreendedorismo do campo, apesar de ter crescido, ainda requer que esses segmentos alcancem maiores patamares.
O crescimento do agronegócio, com incentivos à monocultura para exportação, continua como uma ameaça à biodiversidade das regiões brasileiros. Porém, o uso de tecnologias tem permitido o aumento da produtividade, evitando a devastação de novas áreas para produção agropecuária.
Por fim, a manutenção do papel da agricultura familiar, na produção de alimentos diversos, é um aspecto positivo identificado pelo Censo, pois continua garantindo mais saúde à mesa dos brasileiros.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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