Hoje, dia 05 de junho, é celebrado, mundialmente, o Dia do Meio Ambiente. Este ano, a data acontece em meio a uma grave situação de pandemia e a inúmeras manifestações pela igualdade racial entre os povos, em vários países do mundo.
Em abril de 2020, foi lançado o livro “O amanhã não está à venda”, com entrevistas recentes de um dos mais importantes líderes do movimento indígena e ambientalista brasileiro, Ailton Krenak, que atua desde os anos 1980.
Na obra, o escritor, pertencente à etnia indígena Krenak, analisa nossa relação com o ambiente, antes da pandemia, e as mudanças necessárias depois dessa dolorosa crise sanitária global.
Confira, a seguir, as 05 principais lições, da cosmologia dos povos Krenak, para a construção de um estilo de vida e de um modelo econômico mais sustentável, depois da experiência da pandemia.
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Durante muito tempo, as comunidades indígenas estavam ameaçadas de ruptura ou da extinção do sentido das suas vidas. Hoje, todos os povos estão diante da iminência de a Terra não suportar as demandas de 7,7 bilhões de pessoas.
Na atual pandemia, acontece, diariamente, uma tragédia de milhares de pessoas morrendo, em diferentes lugares do Planeta. Essa dor talvez nos ajude a repensar nossa relação com a natureza.
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De acordo com Ailton Krenak, o vírus está discriminando os seres humanos, pois somente a nossa espécie está morrendo, por conta da pandemia. O vírus é uma resposta do Planeta ao estilo de vida doentio dos humanos, com um ataque à forma de vida insustentável que adotamos, por livre escolha.
Como vimos neste post, de fato, patógenos, como o novo coronavírus, “saltam” de espécies animais para os humanos, em função de destruirmos os habitats dos animais e provocarmos desequilíbrios na natureza. Por exemplo, o atual modelo de agricultura em larga escala, para alimentar uma enorme população global, é praticado ao custo das nossas florestas e da manutenção dos ecossistemas silvestres.
Para o líder Krenak, quem está em pânico, na atual pandemia, são as populações humanas, e o mundo artificial que construíram. Seu modo de funcionamento entrou drasticamente em colapso. Mas ele assegura que “Um outro mundo é possível. Para combater esse vírus, temos de ter primeiro cuidado e depois coragem”, completa o indígena.
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É terrível o que está acontecendo, com a devastação provocada pelo novo coronavírus. Mas a sociedade precisa entender que devemos abandonar o antropocentrismo. Há muita biodiversidade na Terra, além dos seres humanos, que precisa dos seus habitats para sobreviver.
Acontece que enquanto a lista de espécies em extinção aumenta, os humanos proliferam, destruindo florestas, rios e animais. Tentamos sobreviver, desconectados, de maneira absoluta, desse organismo que é a Terra. Vivemos em uma abstração civilizatória que suprime a diversidade, nega a pluralidade das formas de vida, de existência e de hábitos.
Habitamos ambientes artificiais, produzidos pelas grandes corporações, que supervalorizam o lucro imediato. Mas agora, como resposta dos nossos excessos, o vírus, um organismo da natureza, tira nosso oxigênio, para garantir sua própria propagação e sobrevivência. A Terra nos oferece oxigênio de graça, mas deixa um ensinamento para a humanidade: o silêncio, a experiência do confinamento e o repensar do nosso estilo de vida.
Temos de parar de vender o amanhã, de devastar os recursos naturais. O futuro é aqui e agora. Podemos sair dessa experiência da pandemia com uma nova consciência, valorizando o que realmente importa: a vida e a dignidade humana para todos.
Os povos indígenas foram as maiores vítimas de epidemias mortais, em toda a história. Hoje, essas pequenas comunidades do Brasil se protegem do risco de contato com pessoas assintomáticas, que já contraíram a Covid-19.
O líder indígena ressalta que, há muito tempo, o povo Krenak já vivia refugiado, em seu próprio território. A comunidade dispõe de uma reserva de apenas 4 mil hectares. Segundo ele, deveria ser muito maior, se a Constituição fosse cumprida. Eles não são mais senhores de suas próprias terras. Mas esse confinamento involuntário os deu resiliência e os tornou mais resistentes.
O exemplo dos Krenak mostra que não estamos “apenas” devastando o Planeta, mas criando um fosso gigantesco de desigualdades entre povos e sociedades. Há populações que vivem em uma grande miséria, sem chance de sair dela. Essa situação foi historicamente naturalizada, com grupos sociais que se tornaram invisíveis, como negros e comunidades indígenas.
E agora, a pandemia coloca em evidência a dimensão das perversas desigualdades sociais. As assimetrias incluem desde o ambiente insalubre onde vivem, passando pelo acesso à educação, saúde e saneamento básico precários, até as desumanas relações de trabalho.
Porém, do ponto de vista do vírus, os seres humanos são iguais, podendo provocar a morte tanto do rico quanto do pobre. Por isso, a pandemia poderá contribuir para reduzir essas cruéis disparidades sociais entre os povos.
A tomada de decisão, por parte de alguns gestores públicos, tem favorecido a morte da biodiversidade e das pessoas. É a chamada necropolítica, que abre as porteiras para a devastação da Amazônia, o descuido com a saúde pública, a perseguição aos direitos indígenas e o aumento da pobreza.
Segundo o líder Krenak, diante da gravidade da pandemia, é insensato declarar ser prioridade manter as atividades econômicas, mesmo que seja inevitável a morte de “alguns”. Os mais afetados seriam os idosos, grupo de risco que guarda um enorme legado de saberes e experiências, além de impactar as pessoas que por eles têm afeto. Não podemos banalizar a vida e o poder da palavra, condenando essas pessoas ao descarte.
Para os Krenak, se os humanos estão em risco, em função do mercado que eles próprios criaram, qualquer atividade econômica deixa de ter importância. O navio não importa mais que a tripulação. O ser humano não é útil apenas quando está produzindo e a manutenção da vida é primordial.
Em 2015, houve o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG). O rio Doce, berço e refúgio dos povos Krenak, foi mortalmente devastado pela enxurrada de lama e rejeitos de minério, oriundos do desastre ambiental, provocado pela mineração. Faz tempo que a comunidade Krenak luta pela recuperação das suas águas.
No livro, Ailton Krenak conta que engenheiros lhe consultaram para dizer que iriam usar a tecnologia para recuperar aquela bacia hidrográfica. Na ocasião, ele sugeriu que seria necessário parar todas as atividades humanas, em torno do rio, a cem quilômetros, nas margens direita e esquerda, até que ele voltasse a ter vida.
Um dos engenheiros lhe respondeu que seria impossível colocar em prática, pois o mundo não poderia parar. Porém, o indígena afirma que, de fato, o mundo parou com a pandemia.
Os únicos núcleos que ainda consideram que precisam se manter agarrados à Terra são aqueles que ficaram esquecidos, pelas bordas do Planeta, como uma sub-humanidade: caiçaras, índios, quilombolas e aborígenes.
São povos rústicos e orgânicos, que se sentem excluídos dessa humanidade, que devasta o Planeta, e não desejam se adequar aos seus padrões “civilizatórios”. Na cosmologia dos indígenas, como os Krenak, tudo é natureza, da qual fazem parte e permanecem conectados à Terra.
No mundo pós-pandemia, podemos aprender, com esses povos, a construir um mundo mais justo e sustentável. Não tivemos capacidade crítica para prever respostas a uma possível crise sanitária, nos grandes centros urbanos, em metrópoles que já enfrentavam tão graves problemas.
As mudanças já estão em gestação. “Tomara que não voltemos à normalidade, pois, se voltarmos, é porque não valeu nada a morte de milhares de pessoas no mundo inteiro”, conclui o líder Krenak.
Para construirmos esse mundo pós-pandemia, com um modelo de economia mais sustentável e um estilo de vida mais simples, o conhecimento científico e a educação serão essenciais.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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