Foi publicado, no último dia 08 de outubro, o novo Relatório de avaliação climática do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), formado por centenas de pesquisadores, oriundos de diversos países, convocados pela Organização das Nações Unidas (ONU).
De acordo com os especialistas, limitar o aquecimento global a 1,5 ºC demandaria mudanças rápidas, profundas e sem precedentes em todos os setores da sociedade. Também exigiria transições abrangentes em energia, indústria, edificações, transporte e nas cidades.
Até 2030, as emissões globais de dióxido de carbono (CO2), causadas pelo ser humano, devem ser reduzidas em cerca de 45%, em relação aos níveis de 2010, e até 2050, chegar a um balanço zero (remover da atmosfera tudo que for emitido).
Considerando-se que temos apenas 12 anos até 2030, não se trata de um desafio trivial, sobretudo levando em conta que o Planeta está, hoje, 1 ºC mais quente do que na era pré-industrial. As consequências desse aquecimento já são sentidas, tais como: aumento do nível do mar, declínio mais rápido no gelo do mar Ártico, frequência dos eventos climáticos extremos, dentre outras.
As projeções dos modelos climáticos indicam que, seguindo a linha das atuais emissões, o Planeta atingirá mais de 3 ºC ainda neste século. O mundo três graus mais quente, com uma população de 9 bilhões, foi surpreendente para os cientistas. Os impactos seriam devastadores, particularmente para as comunidades mais vulneráveis.
Diante das novas projeções que apontam para 3 ºC, até 2100, as metas do Acordo de Paris (2015) são insuficientes para conter o aquecimento global abaixo de 2 ºC. Vale lembrar que embora essas metas tenham sido propostas pelos próprios países, têm enfrentado dificuldades para serem cumpridas.
O Relatório Especial do IPCC, intitulado Aquecimento Global a 1,5 ºC, será uma contribuição científica fundamental para a Conferência sobre Mudanças Climáticas, a ser realizada na Polônia, em dezembro deste ano. Na ocasião, será feita uma revisão nos compromissos do Acordo de Paris.
O documento do IPCC destacou a necessidade de limitar o aquecimento global a 1,5 ºC, adotando medidas para não atingir os 2 ºC. Para isso, será necessário um esforço global massivo, muito mais agressivo do que qualquer outro que vimos até agora, para manter o aquecimento 1,5 ºC. Sem esse esforço, continuaremos em nossa atual trajetória em direção a 3 ºC de aquecimento. Quanto mais baixas forem as emissões em 2030, menor será o desafio de limitar o aquecimento global a 1,5 ºC, a partir de então.
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Os especialistas destacaram a importância de um esforço concentrado para conter o aumento da temperatura do Planeta em 1,5 ºC, acima dos níveis pré-industriais. Embora considerada uma meta extremamente difícil, ressaltaram como apenas meio grau fará uma grande diferença no processo de adaptação e mitigação das mudanças climáticas.
Neste post, destacamos, com base no novo Relatório climático do IPCC, os benefícios de se adotarem medidas para conter a temperatura do Planeta em 1,5 ºC, definindo ferramentas para mitigar o aquecimento global. A seguir, mostraremos o que irá acontecer se nos rendermos diante das mudanças climáticas, continuando a queimar petróleo e carbono, bem como a cortar florestas, perdendo o controle do aquecimento global.
Os especialistas do IPCC destacaram que os riscos climáticos aos sistemas naturais e humanos serão mais altos para o aquecimento global de 1,5 ºC, estabilizado até 2100, mas muito piores se a temperatura chegar a 2 ºC. Esses riscos dependem da dimensão do aquecimento global, localização geográfica, níveis de desenvolvimento e vulnerabilidade, e das ações de adaptação e mitigação implementadas.
Se a temperatura do Planeta não for contida em 1,5 ºC, alguns impactos podem ser duradouros ou irreversíveis, como a perda de alguns ecossistemas.
Dentre os impactos sobre a biodiversidade e os ecossistemas, estão perda e extinção de espécies, projetadas para serem inferiores a 1,5 ºC do aquecimento global, em comparação com os 2 ºC. Estima-se que limitar o aquecimento global a 1,5 ºC reduzirá os impactos nos ecossistemas terrestres, de água doce e costeiros.
Das 105.000 espécies estudadas, 6% dos insetos, 8% das plantas e 4% dos vertebrados são projetadas para perder mais da metade da sua faixa geográfica, climaticamente determinada, para o aquecimento global de 1,5 ºC, em comparação com 18% dos insetos, 16% das plantas e 8% dos vertebrados, para aquecimento global de 2 ºC. Os impactos associados a outros riscos relacionados à biodiversidade, como incêndios florestais e a disseminação de espécies invasoras, também são mais baixos a 1,5 ºC.
Impactos da mudança climática no oceano estão aumentando os riscos para as atividades pesqueiras, em função de impactos na fisiologia, sobrevivência, habitat, reprodução, incidência de doenças e risco de espécies invasoras, mas são projetados para ser menor a 1,5 ºC do aquecimento global, se comparados a um cenário de 2 ºC.
Os modelos climáticos projetam diferenças robustas nas características do clima regional entre o aquecimento global de 1,5 °C e entre 2 °C.
Essas diferenças incluem aumento na temperatura média na maioria das regiões terrestres e oceânicas, extremos de temperatura na maioria das áreas habitadas e extremos climáticos em outras regiões, como precipitação intensa ou probabilidade de seca.
Uma das maiores ameaças para as cidades ao redor do mundo é a elevação do nível do mar, causada pela expansão da água em altas temperaturas e o derretimento das camadas de gelo nos polos Norte e Sul.
Até 2100, prevê-se que a subida média global do nível do mar seja cerca de 10 cm mais baixa, a um aquecimento global de 1,5 ºC, em comparação com 2 ºC. O aumento do nível do mar depende das taxas de emissão.
Um aumento do nível do mar mais lento, com o aquecimento global de 1,5 ºC, reduz esses riscos, permitindo maiores oportunidades de adaptação, incluindo a gestão e recuperação de pequenas ilhas e ecossistemas costeiros naturais, com tempo suficiente para o reforço das infraestruturas.
O aumento do aquecimento global amplia a exposição de pequenas ilhas e áreas costeiras aos riscos associados à elevação do nível do mar, para muitos sistemas humanos e ecológicos, incluindo o aumento das inundações e danos às infraestruturas. Os riscos associados à elevação do nível do mar são maiores a 2 ºC, em comparação com 1,5 ºC.
Muitas cidades serão inundadas com o risco do aquecimento global de 3 ºC, acima dos níveis pré-industriais. Cientistas da organização sem fins lucrativos Climate Central estimam que 275 milhões de pessoas no mundo vivem em áreas a serem, eventualmente, inundadas a 3 ºC de aquecimento global.
O impacto regional dessas mudanças é altamente desigual, com quatro em cada cinco pessoas afetadas vivendo na Ásia.
Não devemos agir contra as consequências das mudanças climáticas daqui a 50 ou 80 anos. As iniciativas são urgentes, pois o Relatório do IPCC mostra que o cenário mais otimista trará impactos devastadores para a sociedade. Assim, se no passado a nossa resposta esteve focada na redução das causas do aquecimento global, considerando que a mudança climática é inevitável e já está em curso, estamos discutindo como responder aos desastres naturais decorrentes desse processo.
Cidades do mundo inteiro enfrentarão consequências do aumento de temperatura em torno de 3 ºC, dentre elas: Osaka (Japão), Alexandria (Egito), Rio de Janeiro (Brasil), Shangai (China), Miami (Estados Unidos). Muitas dessas cidades já estão adotando medidas e estratégias de controle das águas e represas, melhorando estações de bombeamento, drenagem e construindo muros de prevenção contra o risco de inundações. São medidas para conter o avanço do nível do mar sobre as estruturas urbanas.
Os riscos relacionados ao clima para os meios de subsistência, segurança humana e crescimento econômico irão aumentar com o aquecimento global de 1,5 °C, sendo ainda mais graves a 2 °C.
As consequências adversas das mudanças climáticas terão riscos desproporcionais para a população, sendo mais intensas para os grupos sociais vulneráveis e mais pobres, como povos indígenas e comunidades locais dependentes de meios de subsistência agrícolas ou costeiros. Com isso, haverá aumento da pobreza, da fome e das desigualdades sociais.
Na Amazônia, cerca de 30 milhões de pessoas serão afetadas pelo aumento da temperatura do Planeta, um processo a atingir principalmente as populações mais pobres.
No Semiárido brasileiro, haverá extremos de seca, mais ainda do que já têm sido registrados, a exemplo da recente “Seca do Século” (2010-2017). As populações que vivem ali estarão em grande risco se o aquecimento passar de 1,5 ºC, havendo o consequente aumento da migração.
Para compreender melhor as consequências das mudanças climáticas e da desertificação no Semiárido brasileiro, leia o Livro “Um século de secas: por que as políticas hídricas não transformaram o Semiárido brasileiro?” (Editora Chiado, Portugal). Para adquirir o Livro, clique aqui.
As regiões que apresentam um risco mais elevado incluem os ecossistemas do Ártico, as regiões áridas, os pequenos estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos. Limitar o aquecimento global a 1,5 °C, em comparação com os 2 °C, poderá reduzir o número de milhões de pessoas expostas a riscos relacionados ao clima e suscetíveis à pobreza.
Os riscos relacionados com o clima para a saúde irão aumentar com o aquecimento global de 1,5 ºC e serão ainda mais graves a 2 ºC. Qualquer aumento no aquecimento global é projetado para afetar a saúde humana, com consequências negativas.
Os riscos menores são projetados se a temperatura do Planeta chegar a 1,5 ºC, do que a 2 ºC, para morbidade e mortalidade relacionadas ao calor, sobretudo nas cidades. Os riscos de algumas doenças transmitidas por vetores, como malária e dengue, devem aumentar com o aquecimento de 1,5 ºC, sendo mais graves se atingir 2 ºC, incluindo mudanças potenciais em sua distribuição geográfica.
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De acordo com a Universidade das Nações Unidas, as mudanças climáticas e a maior urbanização têm aumentado as áreas vulneráveis à ameaça de surtos de dengue, sobretudo em grandes partes da Europa, no oeste e no centro da África e na América do Sul. O Brasil é o país que mais registrou casos da doença no mundo, entre 2004 e 2010.
As mudanças climáticas também ampliam muito os processos de degradação das terras, aumentando a perda da capacidade produtiva dos solos e a desertificação. Alterações no regime de distribuição das chuvas, em função do aumento nas temperaturas do Planeta e da ação humana, também tornarão ainda maior o risco de degradação das terras.
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Os impactos da mudança climática (secas, altas temperaturas ou chuvas intensas) afetam negativamente a produção agrícola e, consequentemente, a disponibilidade de alimentos. Assim, as mudanças climáticas irão aumentar a fome e a dificuldade de acesso à água no mundo, especialmente nas regiões tropicais.
Limitar o aquecimento a 1,5 °C, em comparação com 2 °C, trará reduções menores nas produções de milho, arroz, trigo e outras culturas de cereais, particularmente na África Subsaariana, Sudeste Asiático, Américas Central e do Sul.
As reduções na disponibilidade de alimentos serão maiores a um aquecimento global de 2 ºC, do que a 1,5 ºC, em regiões como o Sahel, no sul da África, no Mediterrâneo, na Europa central e na Amazônia. O aumento das temperaturas terão consequências adversas na agricultura e pecuária, afetando a qualidade dos alimentos, a propagação de doenças e a disponibilidade de recursos hídricos.
As mudanças climáticas também irão aumentar a crise hídrica. Em um aquecimento global a 2 ºC, a proporção da população mundial exposta ao estresse hídrico será de té 50%, embora haja considerável variabilidade entre regiões. Limitar o aquecimento global a 1,5 ºC pode reduzir sobremaneira esse impacto.
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Os riscos para o crescimento econômico global, devido aos impactos das mudanças climáticas, são projetados para ser inferiores a 1,5 ºC, se comparado a 2 ºC, até o final deste século.
A exposição a riscos relacionados ao clima aumenta entre 1,5 ºC e 2 ºC do aquecimento global, com proporções maiores de pessoas expostas e suscetíveis à pobreza na África e na Ásia.
A transição energética rápida é fundamental para reduzir os impactos das mudanças climáticas.
A redução profunda nas emissões exige transições sem precedentes em todos os setores, em termos de escala e de velocidade, com um amplo aumento dos investimentos em ações de mitigação, especialmente no setor de energia limpa e eficiência energética.
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Limitar o aquecimento da temperatura do Planeta a 1,5 ºC permitirá maior tempo para ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. É necessário investimentos específicos que aumentem a resiliência às mudanças climáticas, a partir da provisão de infraestrutura básica, atualmente subinvestida. A estimativa dos custos de adaptação pode ser menor a um aquecimento global de 1,5 ºC, se comparada a 2 ºC.
Uma das ações fundamentais para impedir mudanças climáticas catastróficas é aprofundar o conhecimento e o monitoramento dos fenômenos oceânicos e climáticos, incluindo a evolução do nível do mar. O Sensoriamento Remoto é considerado pelo IPCC uma abordagem fundamental para avaliar a degradação das terras e monitorar as condições climáticas em escala local ou regional.
Para ler o novo Relatório climático do IPCC, clique aqui.
A batalha das mudanças climáticas ameaça todos os países, com possibilidade de consequências globais desastrosas. Os impactos das mudanças climáticas à biodiversidade, aos recursos naturais e às sociedades humanas, em futuro breve, depende das ações adotadas hoje para conter o aumento da temperatura do Planeta. Os países não devem deixar falir o projeto de conter o avanço do aquecimento global.
Os desafios das ações postergadas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa incluem o risco de aumento dos custos e a flexibilidade reduzida nas futuras opções de resposta. Estes podem aumentar os impactos distributivos desiguais entre países em diferentes estágios de desenvolvimento.
O novo Relatório de avaliação climática do IPCC é um estrondoso apelo à ação por mudanças rápidas, em todos os setores da sociedade, visando minimizar os impactos das mudanças climáticas.
Na sua opinião, quais ações podem ser feitas de imediato para reduzir o risco das mudanças climáticas? Você acha que o Brasil terá compromisso para reduzir os efeitos do processo de alterações climáticas?
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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