Mudanças climáticas. Você já deve ter ouvido muito falar sobre esse assunto e em suas consequências para as populações e os ecossistemas. Certamente, já se perguntou de que forma as propaladas alterações ambientais afetarão a sua vida.
Será possível conviver com o processo de mudanças climáticas, de forma sustentável? Quais serão seus impactos nas regiões semiáridas? E no caso da Caatinga, bioma exclusivamente brasileiro?
Recentemente, uma pesquisa do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis) identificou já existirem áreas áridas severamente degradadas no Nordeste brasileiro que já reduzem nuvens de chuva na região. As áreas áridas e semiáridas do Brasil tendem a se expandir, em razão da piora nas secas e na degradação, no contexto da mudança climática. Acesse este post e saiba mais sobre a pesquisa.
A Caatinga é considerada a área semiárida mais rica em biodiversidade do mundo. Dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA) indicam que há uma grande riqueza de espécies no bioma, com 932 variedades de plantas, 178 de mamíferos e 590 de aves.
Do total, pelo menos 318 são endêmicas, ou seja, ocorrem somente na Caatinga. Esta ocupa cerca de 11% do território brasileiro (844 mil km2), onde vivem quase 28 milhões de pessoas.
Apesar da sua importância para o Brasil e o mundo, o bioma não tem sido foco de preocupações das políticas de conservação e sustentabilidade ambiental no País.
A Caatinga tem sido intensamente degradada, em razão das diversas pressões decorrentes de atividades humanas, sem o manejo adequado (agricultura de baixa tecnologia, pecuária extensiva e extrativismo insustentável).
Atualmente, cerca de 25% da energia consumida pelos setores industrial e comercial do Nordeste ainda é oriunda da biomassa florestal da Caatinga, em forma de lenha, representando a segunda principal fonte energética da região.
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Como consequência dos fatores naturais e antrópicos, cerca de 62% das áreas susceptíveis à desertificação no Brasil se encontram na Caatinga. Por outro lado, somente 1,5% do seu território está inserido em unidades de conservação ambiental de proteção integral.
Essa situação se intensifica durante as secas extremas, quando há escassez na produção de alimentos e nos principais meios de subsistência locais, aumentando a degradação dos ecossistemas, cenário a se agravar ainda mais com as mudanças ambientais.
O processo de mudanças climáticas já está em curso e seus impactos serão sentidos em todo o Planeta, nas próximas décadas, sobretudo a partir da segunda metade do século 21.
Neste post, selecionamos os 10 motivos pelos quais você deve se preocupar com o futuro da Caatinga, diante das mudanças climáticas.
As mudanças climáticas irão aumentar a frequência e intensidade de eventos climáticos extremos, como secas, em razão da elevação da temperatura na Terra. Este é o consenso científico dos especialistas reunidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês).
As projeções dos pesquisadores situa a Caatinga como uma das regiões geográficas mais afetadas pelas mudanças climáticas no Brasil. O bioma poderá sofrer uma redução de até 40% nas suas chuvas, impactando diretamente diversos setores sociais e produtivos.
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Eventos climáticos extremos, como as secas, produzem danos e impactos socioeconômicos generalizados, tomando proporções de verdadeiros desastres naturais. Foi o caso da histórica "seca do século", ocorrida no período de 2010-2017, conforme analisada no Livro "Um século de secas".
As secas extremas expõem a vulnerabilidade da população diante das políticas públicas inefetivas e a fragilidade da infraestrutura dos diversos setores, frente aos sistemas ambientais. Dessa forma, altera o funcionamento da economia e o bem-estar social.
Segundo o Relatório de Danos Materiais e Prejuízos Decorrentes de Desastres Naturais no Brasil (1995-2014), os desastres naturais informados com maior frequência pelos municípios da Caatinga são relativos a estiagens e secas. Neste post, falamos com mais detalhes sobre o enorme custo das secas para o Brasil.
No Anuário Brasileiro de Desastres Naturais, consta 3.096 registros de ocorrência de eventos de seca e estiagem, somente em 2013, em municípios do Semiárido. Esse total representa 70% dos desastres naturais ocorridos no Brasil naquele ano.
Desenvolver mecanismos de adaptação às secas extremas hoje é um passo fundamental para promover a resiliência dos ecossistemas e da população humana aos impactos das mudanças climáticas projetadas para futuro breve.
Diante das mudanças climáticas, e sua relação com a crescente ocorrência de desastres naturais, o aumento na frequência e na intensidade das secas demanda dos governos e sociedade urgência na implementação de ações estruturais e não estruturais, com foco na gestão integrada de riscos de desastres.
A seca é considerada um desastre natural crônico-silencioso, cujos impactos ambientais e econômicos negativos afetam milhares de pessoas, sendo, muitas vezes, relegados pelos formuladores de políticas públicas.
A extensão e frequência recorrentes da seca causam prejuízos a diversas atividades econômicas, nos setores da agricultura, pecuária, indústria, serviços e comunidade em geral.
O Semiárido brasileiro é a região do País mais afetada pelo processo de mudanças climáticas. No Livro "Um século de secas", o coordenador do novo relatório do IPCC sobre mudanças climáticas e uso da terra, pesquisador Humberto Barbosa, mostra os impactos do processo de mudanças climáticas previstos para a região.
O novo relatório do painel climático da ONU sobre mudanças climáticas e uso da terra foi divulgado na última quinta-feira, dia 08 de agosto de 2019. Escrevemos sobre os principais pontos do documento neste post.
O autor do Livro “Um século de secas” foi o único brasileiro selecionado pelo IPCC para coordenar um dos capítulos do relatório, que trata da degradação da terra. Ele também participou da elaboração do sumário final do relatório para orientar políticas públicas.
A desertificação, a garantia dos meios de subsistência locais pelas comunidades mais vulneráveis, a disponibilidade de água potável, em um cenário de mudanças climáticas e de intensificação da seca, estão entre os maiores desafios apontados pelo pesquisador para a região semiárida do Brasil.
No Livro “Um século de secas”, o pesquisador buscou as principais lições da história das políticas públicas no Semiárido brasileiro para orientar a gestão da seca e minimizar os impactos das mudanças climáticas nos dias atuais.
A obra também destaca as medidas a serem adotadas por formuladores e gestores de políticas, representantes da sociedade civil e produtores rurais, com o intuito de promover ações de adaptação às secas na região, diante do possível cenário de mudanças climáticas.
A vegetação da caatinga, embora seja xerófila e altamente adaptada às secas, poderá ser afetada pelas mudanças climáticas. O processo de alterações ambientais exigirá um alto nível de adaptação das espécies da flora nativa às novas condições ambientais.
Pesquisadores afirmam que eventos climáticos extremos, como a seca de 2012, levam as plantas da Caatinga a operarem em seus limites fisiológicos.
Com a redução das chuvas, provocada pelas mudanças climáticas, os ecossistemas da Caatinga poderão alcançar um ponto crítico de irreversibilidade, causando uma flora e fauna empobrecida.
O processo de degradação da terra e da vegetação, provoca a desertificação, em algumas áreas do bioma, tornando a caatinga extremamente vulnerável aos eventos climáticos extremos e às futuras mudanças climáticas.
Assim, as duas principais estratégias para conservação da biodiversidade e restauração da função ecológica da Caatinga são a criação de unidades de conservação e a restauração de áreas degradadas. Atualmente, apenas 1% da Caatinga é contido em unidades de conservação federais de proteção integral.
Também é fundamental, do ponto de vista científico e político, identificar áreas da Caatinga atualmente vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas. É o caso de áreas ecologicamente vulneráveis à seca.
O monitoramento ambiental por satélites, a exemplo do realizado pelo Laboratório Lapis, oferece ferramentais fundamentais para avaliar a resposta da vegetação às mudanças climáticas, usando séries temporais de imagens de satélite de alta resolução.
A Caatinga é um ambiente altamente susceptível à desertificação, processo caracterizado pela perda progressiva da cobertura vegetal, causada por ações antrópicas, como desmatamento e desflorestamento, associadas a intervenções naturais. Segundo dados do MMA, já foi desmatada cerca de 46% da sua área total.
Esse fator aumenta a exposição dos solos aos processos erosivos, tornando as terras secas estéreis à produção agrícola, provocando intenso êxodo da população rural.
A recuperação de áreas degradadas é considerada economicamente inviável e as mudanças climáticas tornarão o processo de desertificação uma condição ambiental ainda mais grave.
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Segundo o mapa acima, elaborado pelo Lapis, os níveis de degradação ambiental, em relação às áreas totais dos estados do Semiárido brasileiro, estão distribuídos da seguinte forma: Alagoas (32,8%), Paraíba (27,7%), Rio Grande do Norte (27,6%), Pernambuco (20,8%), Bahia (16,3%), Sergipe (14,8%), Ceará (5,3%), Minas Gerais (2,0%) e Piauí (1,8%).
De acordo com o novo Relatório do IPCC (2019), o setor agropecuário é considerado um dos motores da mudança climática e da degradação da terra. As mudanças climáticas irão reduzir a produção agrícola no Brasil, em particular da Caatinga, dificultando o acesso à alimentação e a estabilidade nos preços.
Segundo Humberto Barbosa, coordenador do relatório do IPCC, aumentar a produtividade das terras já agricultáveis, reduzir o desmatamento e desenvolver um modelo de produção mais sustentável de alimentos, estão entre os principais pontos discutidos no novo relatório do IPCC.
As mudanças climáticas e a degradação da terra irão diminuir a segurança alimentar, especialmente de populações mais pobres, em áreas urbanas e rurais. Os grupos sociais mais prejudicados serão jovens e mulheres.
Projeções apontam até mais de 25% de perdas nas colheitas, no período de 2030-2049, em comparação com o final do século XX, a depender do nível de adaptação às mudanças climáticas desenvolvido em cada região.
Além disso, em ambientes semiáridos, haverá redução na obtenção de renda com produção de alimentos nas áreas rurais, especialmente por parte de agricultores e pecuaristas com recursos escassos.
Esse aspecto irá diminuir o nível das condições de vida da população que vive da agricultura familiar, como mais uma consequência extrema das mudanças climáticas.
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Na Caatinga, onde cerca de 90% dos empreendimentos rurais agropecuários são oriundos da agricultura familiar, os impactos dessas mudanças climáticas poderão afetar diretamente cerca de 8,5 milhões de pessoas, frequentemente encontradas em condições de extrema pobreza.
De acordo com a ONU, as mudanças climáticas intensificarão a crise hídrica em diversas regiões do Planeta, afetando as populações humanas e os ecossistemas, em particular, devido às alterações previstas na sua qualidade e quantidade.
Os efeitos negativos desse novo cenário ambiental provocarão uma grande redução da disponibilidade de água superficial e subterrânea, acirrando a competição pelo recurso natural.
O fenômeno representará um sério obstáculo à garantia dos direitos humanos à água, sendo necessário consolidar eficientes mecanismos de gestão e governança dos recursos hídricos, visando promover a justiça ambiental.
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Ainda segundo o Relatório do IPCC, com as mudanças climáticas, grande número de espécies terrestres e aquáticas estará ameaçado. O motivo será o aumento na temperatura do Planeta, associado a fatores de risco já existentes, como a alteração dos habitats, sobre-exploração, poluição e espécies invasoras.
Uma pesquisa recente do Laboratório Lapis identificou que já existem áreas áridas no Nordeste brasileiro e a degradação severa das terras (desertificação) já provoca redução das nuvens de chuva na região.
A mudança climática irá aumentar a pobreza, em função de diminuir a capacidade de produção de alimentos e limitar os meios de subsistência locais.
As áreas mais afetadas por secas no Brasil têm a agricultura familiar como principal atividade econômica. Com a mudança climática, haverá altas temperaturas e aumento na frequência das secas. No período 2011-2017, foi registrada na região a pior seca do século, com aumento nos preços dos alimentos, prejuízos socioeconômicos e impactos sobre a vegetação da caatinga.
O aumento da seca provoca maior degradação das terras e piora o processo de desertificação, aumentando a migração e reduzindo a capacidade de produção de alimentos. O processo também influenciará na segurança alimentar, criando novas situações de pobreza, sobretudo nas áreas socialmente mais vulneráveis.
O crescimento econômico nos diversos países também será limitado pelas mudanças climáticas. No período de 1995-2014, no Nordeste brasileiro, o valor dos danos e prejuízos, públicos e privados, provocados por desastres naturais de origem climatológica, correspondeu a R$ 47 bilhões.
Desse total, a maior parte, cerca de 75%, está diretamente relacionada às condições ambientais de estiagens e secas. Esses números foram mostrados pelo Relatório de Danos Materiais e Prejuízos Decorrentes de Desastres Naturais no Brasil. Os dados são discutidos com mais detalhes no Livro "Um século de secas".
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Como primeiro passo para adaptação às mudanças climáticas, os especialistas recomendam a redução da vulnerabilidade e da exposição das regiões à variabilidade climática atual.
Na Caatinga, evidencia-se uma situação de despreparo, vulnerabilidade e exposição à seca por parte de diversos setores sociais e econômicos, a exemplo do recente evento climático ocorrido no período 2010-2017.
Faltam também políticas e mecanismos relacionados à adaptação aos efeitos da seca, bem como à gestão de desastres naturais, integrada ao planejamento e tomada de decisão.
O aumento na frequência de eventos climáticos extremos elevará as pressões antrópicas sobre a Caatinga. Um dos motivos é o fato de a população encontrar na floresta fontes alternativas para garantir sua subsistência, em termos de alimentação e geração de renda.
Um dos maiores problemas relacionados ao crescente desmatamento na Caatinga é a degradação das terras e o aumento da vulnerabilidade do bioma ao processo de desertificação.
Estudos da Universidade das Nações Unidas sobre desertificação indicam que, nos próximos dez anos, mais de 50 milhões de pessoas no Planeta terão que migrar das suas regiões, em consequência de ecossistemas secos, causados pela perda da cobertura vegetal natural, por erosão dos solos e pela deterioração das águas.
Segundo estimativas da Convenção das Nações Unidas para Combate à Desertificação (UNCCD), estima-se que 135 milhões de pessoas estão em risco de serem deslocadas pela desertificação, até 2045, como resultado do processo contínuo de degradação das terras.
Certamente, as mudanças climáticas será um dos grandes vetores do processo de degradação das terras, do desmatamento e da consequente migração da população, em busca de outras alternativas de subsistência e de melhores condições de vida.
O conteúdo deste post foi aprofundado no Livro "Um século de secas". Clique aqui para conhecer a obra.
Os países têm enfrentado dificuldades em reduzir as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera. Todavia, essa diminuição é fundamental para inimizar os impactos das mudanças climáticas. O aumento da temperatura do Planeta influenciará ecossistemas secos e vulneráveis às mudanças climáticas, como é o caso da região semiárida do Brasil.
Assim, diante dos riscos ocasionados pelas mudanças climáticas e do aumento da ocorrência de desastres naturais, é fundamental aos governos e sociedade civil implementarem ações de adaptação aos impactos de eventos climáticos extremos.
Que desenvolvam mecanismos e políticas de monitoramento e conservação ambiental da Caatinga, adaptação das populações e dos setores econômicos às secas e fortalecimento dos sistemas de gestão de recursos hídricos.
Outra forma de evitar o aumento da temperatura na atmosfera é reduzindo a destruição e devastação dos ecossistemas, a exemplo da caatinga, bem como o desperdício e a poluição hídricas.
E você, acredita que as mudanças climáticas irão influenciar nas condições fisiológicas da Caatinga? Que ações poderiam ser mais efetivas para a conservação do bioma?
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LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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