Chuvas deste ano dão origem à seca verde no Semiárido brasileiro



Ouça este conteúdo
Parar este conteúdo

Neste post, você vai entender como se caracteriza a seca verde e como as chuvas deste ano no Semiárido brasileiro deram origem a um ciclo de seca verde, influenciando a agricultura e pecuária.

O post também apresenta uma análise meteorológica sobre como o El Niño tem acarretado impactos distintos nas condições climáticas de diferentes áreas do Semiárido brasileiro. Por fim, apresenta-se o resultado do monitoramento da umidade dos solos da região, com base em imagens de satélites que permitem observar o atual estado da seca em cada município da região.

No período de 2010-2017, o Semiárido brasileiro enfrentou a pior seca do século, com profundos impactos no abastecimento de água e na produção de alimentos na região. Em 2019, as chuvas puseram fim àquele longo ciclo de secas que afetou a região. Mas será que as chuvas deste ano realmente encerraram as perversas consequências da última seca?

Depende. Para quem vive nos estados que ficam na porção norte do Nordeste brasileiro (Maranhão, Ceará, Norte do Piauí, Rio Grande do Norte, Oeste de Pernambuco e da Paraíba), este ano, o volume de chuvas foi significativo, tendo havido importante recarga de água nos reservatórios e possibilidade de boas safras. Em outro extremo, o Norte de Minas Gerais também recebeu uma importante quantidade de chuvas.

Já para os moradores da porção central e Sul do Nordeste, mais precisamente do Sul de Pernambuco até o Sul da Bahia, a realidade foi bem diferente. Nessas áreas, o volume de chuvas foi abaixo da média histórica e a recarga dos reservatórios também foi muito aquém da sua capacidade total de armazenamento. 

O volume de chuvas nessa área do Semiárido não foi suficiente para garantir resultados nas safras, sobretudo da agricultura de sequeiro. Esta modalidade de agricultura diz respeito ao cultivo de culturas, como milho, feijão e mandioca, sem a utilização de tecnologias de irrigação, ou seja, dependendo apenas da água das chuvas. 

Seca verde é marcada por perdas da produção agrícola

Criação de cabras em Cabaceiras (PB). Foto: Marcos Amend.

A situação de baixo volume de água nos açudes predomina na maior parte dos municípios das áreas não beneficiadas pelas chuvas, originando um atual cenário de seca verde. Comum no Semiárido brasileiro, a seca verde caracteriza-se pela exuberância da vegetação em meio a um longo período de escassez hídrica e perda das safras agrícolas.

No último post, mostramos como a vegetação da Caatinga está quase completamente revigorada, em razão das chuvas que caíram sobre a região. A recuperação da cobertura vegetal da Caatinga favorece apenas atividades ligadas à pecuária, pois aumenta a disponibilidade de pastagens para alimentar os rebanhos, atividade econômica importante na região.

De acordo com dados da Agência Nacional de Águas (ANA), o volume atual dos reservatórios do Semiárido brasileiro está em torno de 25%. Esse percentual não mostra, de forma precisa, o atual volume de água disponível nos reservatórios de cada estado.

Sergipe e Alagoas estão entre os estados que enfrentaram seca mais intensa nos últimos meses, já estando em situação bastante crítica quanto ao nível de água disponível em seus reservatórios.  

El Niño fraco tem impactos distintos na região

Durante a quadra chuvosa de 2019, que teve início em fevereiro e irá terminar no atual mês de maio, o Ceará foi o estado mais beneficiado pelas chuvas. Somente no mês de abril, registrou-se um volume total de cerca de 200 mm de chuvas, representando 5% acima da média histórica naquele estado. Por consequência, a reserva de água armazenada nos açudes cearenses é a maior da região.

Nos demais estados do Semiárido, o período de estiagem deste ano poderá ser marcado por sérios problemas no abastecimento de água à população rural e urbana. De acordo com dados do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil, um total de 593 municípios do Semiárido brasileiro encontra-se em Situação de Emergência, por ocasião de seca ou estiagem. O número de municípios atualmente reconhecidos nessa condição está distribuído nos estados conforme quadro:

Fonte: Defesa Civil Nacional, em 05/05/2019.

A Paraíba é o único estado do Semiárido brasileiro que atualmente não tem municípios reconhecidos em Situação de Emergência, embora a condição climática de seca e estiagem afete grande parte da área central do estado, mais precisamente as microrregiões dos Cariris paraibanos e do Seridó, consideradas as mais secas do Brasil.

A ausência do reconhecimento federal de Situação de Emergência limita as medidas governamentais que visam garantir recursos para ações de convivência com a escassez de água nesses municípios, a exemplo do abastecimento das comunidades rurais ou urbanas dos municípios com uso de caminhões-pipa.

De acordo com o meteorologista Humberto Barbosa, do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), isso se deve ao fato de o El Niño, configurado atualmente em intensidade fraca no oceano Pacífico, ter influenciado de forma distinta diferentes áreas do Semiárido brasileiro. O pesquisador explica que nas situações de El Niño intenso, a região costuma enfrentar seca de forma generalizada, o que não ocorreu este ano.

“O El Niño fraco bloqueou as frentes frias que vêm do Sul e geralmente provocam chuvas na região Sul do Semiárido, desde a Bahia, podendo influenciar até Pernambuco. Já na porção Norte da região, ocorreu o contrário, pois o atual El Niño não foi decisivo para definir as condições climáticas nessas áreas”, completa o meteorologista.

Essa condição climática permitiu que o aquecimento das águas do Atlântico Sul deslocasse a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) para mais próximo da Costa Norte do Nordeste, favorecendo as chuvas, desde o Maranhão até o Rio Grande do Norte, tendo beneficiado também o Oeste de Pernambuco e da Paraíba.

Para uma análise completa sobre os tipos de seca que afetam o Semiárido brasileiro, incluindo a chamada seca verde e as principais ações de contingência aos impactos do fenômeno, recomendamos a leitura do Livro “Um século de secas” (Editora Chiado, Portugal), com 434 páginas.

O Livro "Um século de secas" é, sem dúvida, uma obra imprescindível aos especialistas e gestores que trabalham com o tema das secas e políticas públicas no Semiárido brasileiro, especialmente por oferecer uma compreensão mais abrangente sobre o tema. Para adquirir a obra, clique aqui.

Imagem de satélite mostra condição da umidade dos solos no Semiárido

O mapa da umidade dos solos, elaborado pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), através de dados de satélites, é um instrumento de tomada de decisão, bastante seguro, que mostra o atual estado da seca no Semiárido brasileiro.

O monitoramento da umidade dos solos é importante por permitir o planejamento da produção agrícola e frutífera na região, além de ser também o “termômetro” para monitorar a recuperação da biomassa florestal. 

De acordo com o mapa de monitoramento dos solos, a maior parte da região está com umidade dos solos acima de 15%. O destaque do mapa acima é para a porção Norte do Nordeste, onde a permanência da ZCIT ocasionou muitas chuvas no último mês de abril. Nessas áreas, a umidade dos solos está acima de 25%. 

A Costa Leste do Nordeste e o Sul Baiano também são áreas com umidade dos solos acima de 20%. No Norte de Minas Gerais, a umidade dos solos está em torno de 15%.

Em toda a área central e Sul do Semiárido brasileiro predomina o nível de umidade dos solos abaixo de 10%, incluindo: Sul do Piauí, Leste da Paraíba, quase todo o estado de Pernambuco, Semiárido de Sergipe e a maior parte do estado da Bahia.

O estado de Alagoas registra a menor umidade dos solos em todo o seu território semiárido, com percentual abaixo de 10%, o mesmo ocorre em algumas áreas da mesorregião do Norte Baiano. 

Conclusão

Diante da atual situação de seca verde que o Semiárido brasileiro enfrenta, mesmo antes de encerrar sua quadra chuvosa, torna-se premente o planejamento de ações sistemáticas para contingência aos efeitos da seca em todos os municípios afetados.

É importante que os municípios da região utilizem instrumentos adequados para monitorar as condições climáticas da sua região, a exemplo de informações de satélites, visando antecipar ações para diminuição dos impactos da seca.

Gostaríamos do seu comentário abaixo para validar as informações deste post. O seu município está situado na área do Semiárido beneficiada pelas chuvas este ano? Ou a seca verde predomina na localidade onde você mora?

COMO CITAR ESTE ARTIGO:

LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].

Gostou do texto? Compartilhe com seus amigos:



Artigos Relacionados

Agricultura

10 motivos para levar a sério alimentos sustentáveis

Pesquisa

5 razões para utilizar imagens de satélites na gestão agrícola

Agricultura

Os 7 principais fatos revelados pelo Censo Agropecuário brasileiro

Inscreva-se

Deixe aqui seu e-mail e receba nossas atualizações.


×

Este site utiliza cookies. Ao fechar este aviso, você concorda. Saiba mais.