O principal pilar da economia brasileira hoje é a exportação de commodities agrícolas, dentre as quais, cana-de-açúcar e soja. Por isso, o País leva em conta que o mercado internacional calcula os riscos associados à mudança climática, e não tolera mais a produção agrícola sem sustentabilidade.
Um dos temas que se tornaram cruciais foi o aumento da produtividade das lavouras, evitando impactos ambientais, decorrentes da conversão de novas terras em áreas agricultáveis. Todavia, para aumentar a produtividade das terras, é fundamental ampliar o uso de tecnologias, que tornem a produção agropecuária mais eficiente e sustentável.
O uso de imagens de satélites está entre as principais ferramentas, que tendem a crescer, no setor agrícola. Dentre as vantagens, encontra-se a possibilidade de se economizar tempo, esforço e recursos, necessários para a tomada de decisão, relacionada ao manejo das lavouras.
A estimativa da produtividade agrícola tem importância para o planejamento estratégico, dos diversos setores da agricultura. Dessa forma, permite estimar o quanto a produção será processada e armazenada, facilitando a tomada de decisão sobre a comercialização dos produtos.
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Geralmente, dados meteorológicos e de sensoriamento remoto são capazes de gerar resultados espacializados, que podem ser relacionados com a variabilidade produtiva e interanual das culturas.
Essas técnicas são utilizadas para estimar a produtividade das lavouras, a partir de componentes como balanço de radiação, precipitação, temperatura de superfície, evapotranspiração potencial, balanço de energia, entre outros.
O monitoramento por satélite complementa o conhecimento adquirido, por consultores agrícolas e produtores rurais, no campo. As observações in loco permitem orientar e calibrar a análise dos dados de satélite, oferecendo uma boa base para a integração espaço-temporal, de ambos os tipos de dados.
Combinar essas informações, com séries de longo prazo disponíveis, permite análises espaciais ainda mais estratégicas, para a agricultura.
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O Brasil é o maior e mais eficiente produtor de açúcar e álcool do mundo. Todavia, a histórica cadeia produtiva sucroalcooleira, que ocupa grandes extensões de terras, depende da quantidade de matéria-prima disponível.
Por sua vez, a cana-de-açúcar associa-se diretamente a fatores como a área plantada, a produtividade agrícola e o açúcar total recuperável (ATR). Desses três fatores, o mais complexo de ser estimado é a produtividade agrícola, pela sua relação com aspectos agronômicos e meteorológicos.
A produção da cana-de-açúcar, em algumas regiões do Brasil, é caracterizada por baixo investimento e está sujeita aos riscos climáticos. Como consequência, a produtividade, em termos agrícolas, de geração de trabalho e de recursos naturais tem permanecido baixa, embora o custo ambiental tenha sido alto, especialmente com respeito à degradação da terra, perda de recursos naturais e de biodiversidade.
Um dos destaques do cultivo dessa gramínea semiperene é sua eficiência na produção de biocombustíveis, com papel fundamental na redução das emissões de gases de efeito. A cultura da cana é uma das mais tecnificadas e capacitadas, no que diz respeito ao uso de técnicas para seu gerenciamento.
Vale dizer que especialistas do Painel Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC) fizeram debates acalorados, no último Relatório especial, sobre o risco de degradação das terras e aumento das emissões, causados pela produção de lavouras para biocombustíveis.
A questão é, particularmente, importante para o Brasil, por ser o maior produtor de açúcar e álcool do mundo, a partir da cana-de-açúcar. O Relatório do IPCC apresenta diretrizes para políticas nos países signatários, entre os quais o País se inclui. Sem falar que o setor de produção de biocombustíveis é um dos seus maiores trunfos, para a questão da mitigação do processo de aquecimento global.
A polêmica foi contornada e o Brasil segue com compromissos ambiciosos, de aumentar a produção de biocombustíveis, até 2030, visando reduzir o ritmo da mudança climática global.
Os sistemas de monitoramento por satélite são imprescindíveis para o conhecimento dos padrões de variabilidade espaço-temporais do clima. Também contribuem com o desenvolvimento de modelos preditivos, sejam de modelos agrometeorológicos ou para a emissão de alertas climáticos e ambientais.
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Para que sejam traçadas medidas que favoreçam o processo produtivo, existe vários modelos, utilizados para a estimativa da produtividade. Dentre eles, estão os modelos agrometeorológicos, que consideram somente a influência dos fatores climáticos sobre a produtividade dos cultivos.
Também são utilizados modelos agronômicos, para estimativa da produtividade agrícola, que tentam representar, de forma simplificada, os principais processos que atuam na produtividade, transformando-os em variáveis quantificáveis.
Porém, os procedimentos estatísticos desses modelos não costumam ter orientação prática, para a tomada de decisão. O baixo desempenho de modelos, muitas vezes, é consequência de conjuntos de dados de entrada limitados.
Recentemente, alguns desses modelos foram aperfeiçoados e combinados às técnicas de sensoriamento remoto, com resultados significativos, apesar da alta variabilidade espacial da produtividade obtida.
Nas últimas décadas uma crescente quantidade de produtos, potencialmente úteis, derivados do sensoriamento remoto, tornaram-se disponíveis, mas seu potencial para melhorar o desempenho de modelos agrometoeorológicos.
Esses modelos permitem a previsão de como será a produção e auxiliam no planejamento agrícola, sendo importante a sua avaliação e validação regional.
Os produtos de satélites fornecem dados frequentes e bastante aproximados de diversos parâmetros agrometeorológicos. Dentre eles, estão: evapotranspiração, albedo da superfície, temperatura da superfície, radiação solar e precipitação, entre outros.
Dessa forma, a estimativa da produtividade das lavouras, seja de soja, milho ou cana-de-açúcar, torna-se mais estratégica, quando se associam produtos derivados de técnicas de sensoriamento remoto, com modelagem numérica.
Essa tecnologia, associada ao conhecimento empírico do campo, em muito auxiliam para a estimativa do período de crescimento e desenvolvimento das lavouras. Dessa forma, torna-se possível alavancar a produção agrícola, com mais sustentabilidade.
Os métodos utilizados para estabelecer a relação planta-clima variam, desde a simples correlação até modelos complexos. Ou seja, funções de produção que podem considerar diferentes parâmetros, envolvidos no sistema produtivo.
As atividades relacionadas ao processamento de dados geográficos/georreferenciados consistem em captar, organizar e elaborar mapas. Para isso, o software QGIS é uma das ferramentas mais poderosas e mais utilizadas no mundo. O software permite adquirir, manipular, integrar, analisar e apresentar os dados georreferenciados, facilitando seu processamento.
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O Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis) validou um conjunto de produtos agrometeorológicos, que permite estimar a produtividade das lavouras.
Os dados de satélites são obtidos a partir da sua própria estação de recepção, chamada “Sistema Eumetcast”, e podem ser utilizados para estimar o período de crescimento e desenvolvimento das culturas, seja da cana-de-açúcar ou de outros cultivos.
São produtos baseados em sensoriamento remoto, como SPOT Vegetation-2, SPOT-5, do satélite SPOT; índice padronizado da cobertura vegetal (NDVI), do satélite Meteosat-11; e produtividade de matéria seca (Dry Matter Productivity, DMP), do programa Copernicus, com resolução espacial de 1 km; e o produto LSA-SAF de evapotranspiração potencial (ETp), para a América do Sul.
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Os produtos são elaborados com uso de um Sistema de Informação Geográfica (SIG), mais precisamente com o software livre e gratuito Quantum GIS (QGIS).
Os produtos são elaborados com foco na aplicação em análises espaciais estratégicas, na agricultura. Esse software permite a edição, visualização e análise de dados georreferenciados.
Os produtos compatíveis com SIG são gerados e integrados, para a estimativa da produtividade e demais parâmetros derivados. Os dados são pré-processados e, em seguida, são criados mapas, para a área analisada, a partir do passo a passo prático abaixo. Os produtos foram validados em grandes fazendas, produtoras de cana-de-açúcar, do interior de São Paulo.
São geradas séries de dados raster, do índice padronizado de vegetação (NDVI), na qual cada mapa da cobertura vegetal representa a média do NDVI, para o período de 10 dias.
O Cálculo da Fração da Cobertura Vegetal (FVC) é o único parâmetro biofísico, que determina a influência do solo e da vegetação, para a evapotranspiração da superfície, fotossíntese, albedo e outros fluxos, cruciais às interações terra-atmosfera.
É feita uma conversão do NDVI para a FVC. Dessa forma, o cálculo da FVC é executado de uma série temporal, de mapas de NDVI.
O Índice de Área Foliar (IAF) é definido como a área foliar total (considerando apenas um lado da folha), por unidade de área do solo. A estimativa é feita a partir da FVC, gerada no passo anterior.
O IAF é um dos mais importantes parâmetros para caracterização do dossel da vegetação. Por ser o índice que quantifica mais diretamente a estrutura do dossel, é altamente relacionado a uma variedade de processos do dossel, como evapotranspiração, intercepção, fotossíntese e respiração.
O Cálculo do Fator de Crescimento Corrigido (CGF) é feito a partir do IAF, estimado no passo anterior. Evidências experimentais indicam que a taxa de crescimento de várias espécies, de cultivos agrícolas, aumenta linearmente, de acordo com o IAF, quando a água e os nutrientes do solo não são fatores limitantes.
A equação final para este cálculo é baseada em outra, que inclui a fração evaporativa corrigida, o fator de crescimento corrigido (CGF), o fator de respiração (BF), o fator de produtividade agrícola (APF) e a produtividade de matéria seca (DMP).
O coeficiente do cultivo é definido como a razão entre a sua evapotranspiração (ETr) e a evapotranspiração de referência (ETp ou ETo). A estimativa é feita a partir do produto ETp, da LSA-SAF.
O Satellite Application Facility on Land Surface Analysis (LSA SAF) faz parte do segmento terrestre de aplicação da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (Eumetsat). Está focado no desenvolvimento e processamento de produtos de satélite, que caracterizam as superfícies continentais, como produtos de radiação, vegetação, evapotranspiração e incêndios florestais.
A estimativa da safra de cana-de-açúcar, durante o processo de crescimento, em base de dez dias, é feita usando um modelo agrometeorológico.
Neste passo, pode ser usada a máscara para extrair o valor de safra estimada (Ye). A lista de mapas de Ye resultante, deve ser sobreposta à máscara das fronteiras municipais da região, de acordo com a área desejada.
A série temporal de Ye corresponde à safra estimada de cana-de-açúcar. Finalmente, para se estimar a produtividade total da safra, a quantidade média de água (por exemplo, 76%), sem estresse, é adicionada à cana-de-açúcar, e o peso inicial dos caules, durante o plantio, deve ser também incluído.
Dessa forma, obtém-se uma informação crucial para se estimar a produtividade agrícola, de diferentes cultivos, a partir da incorporação de produtos de satélite e técnicas de sensoriamento remoto.
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As informações desses post foram aprofundadas no Livro "Sistema Eumetcast", de autoria do professor Humberto Barbosa, coordenador do Laboratório Lapis.
*Post atualizado em: 30.04.2023, às 08h58.
LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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