Fim do El Niño: 7 pontos para entender o clima até 2020


El Niño favorece geração de energia eólica. Foto: ABEólica.


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O El Niño 2019 está oficialmente encerrado. A informação foi divulgada, no último dia 08 de agosto, em boletim da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA), dos Estados Unidos.

>> Leia também: Atualização das condições de El Niño, a partir de maio de 2020

E agora, com o fim do El Niño, o que vai acontecer? Como ficará o clima nas regiões brasileiras, nos próximos meses? O El Niño vai voltar no verão seguinte? Qual a previsão de chuvas para a primavera no Brasil? Como está a temperatura da superfície do Atlântico e qual a sua influência sobre o clima do Nordeste? Qual a situação climática esperada para a produção agrícola no próximo período de plantio?

Desde dezembro de 2018, o El Niño se formou e permaneceu no oceano Pacífico, em geral com intensidade fraca ou moderada, influenciando diretamente o clima no Brasil.

O El Niño é o aquecimento anormal das águas da superfície do oceano Pacífico Equatorial, em sua região central e leste, próximo à costa do Peru. O La Niña, ao contrário, refere-se ao resfriamento anormal das águas naquelas áreas oceânicas.

Como os leitores frequentes deste Blog já sabem, sempre divulgamos aqui as novidades da previsão de El Niño ou de La Niña, analisando seus impactos sobre as diferentes regiões brasileiras. Os dados de monitoramento climático são obtidos do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis).

Este post demandou pelo menos 30 horas para ser produzido, levando em conta o tempo que nossa equipe dedicou à pesquisa e à análise de possíveis cenários climáticos para o Brasil.

O nosso intuito foi traduzir conhecimentos complexos de Meteorologia, em uma linguagem acessível a todos os públicos, oferecendo uma direção mais segura para os produtores.

>> Leia também: O que se sabe até agora sobre como o clima afeta o coronavírus?

Para manter você informado, selecionamos as 7 principais perguntas e respostas para entender as consequências do fim do El Niño sobre o clima nas regiões brasileiras, até os primeiros meses de 2020.

1) Com o fim do El Niño, qual a atual condição do oceano Pacífico?

Modelo climático indica fim do El Niño

Previsão de modelo climático para o Índice Niño 3.4. Fonte: NOAA e CPC.

A imagem acima mostra a tendência da temperatura da superfície do Pacífico oriental, próximo à costa do Peru, até abril de 2020. A previsão foi obtida pela NOAA, no último mês de julho, com base em modelos climáticos. Pela temperatura, é possível definir a presença de um El Niño ou de uma La Niña. 

É possível observar que o El Niño já se dissipou, em fins de julho, e não houve a formação de uma La Niña. Com isso, a temperatura do oceano retornou à média histórica. 

De acordo com a tendência divulgada pela NOAA, a situação atual é de neutralidade no oceano Pacífico Equatorial, nas áreas central e leste. Os modelos indicam uma tendência de leve resfriamento, nessa região do Pacífico, até o fim de 2019.

Para mais informações sobre a neutralidade de El Niño e La Niña, leia este post.

Quando a temperatura média da superfície do Pacífico é superior a 0,5 oC (aquecimento) ou abaixo de -0,5 oC (resfriamento), comparada à média histórica, ocorre o que os meteorologistas chamam de anomalias, caracterizadas como El Niño ou La Niña, respectivamente.

Vale lembrar que essa temperatura média no oceano Pacífico Equatorial deve ser registrada pelo período de três meses consecutivos, condição básica para a formação do El Niño Oscilação Sul (Enso).

Os fenômenos El Niño ou La Niña não são definidos apenas pela temperatura da superfície do Pacífico, ao largo da costa do Peru. Existem também outros critérios, a exemplo da temperatura das camadas subsuperficiais do oceano e da resposta da atmosfera ao aquecimento ou resfriamento do oceano.

No último mês de julho, as condições atmosféricas tropicais tenderam para neutras, já que a nebulosidade e as chuvas sobre o Pacífico estiveram próximas da média histórica.

Com base nesses indicadores do oceano tropical e da atmosfera, os analistas da NOAA declararam, no início de agosto, que o El Niño terminou e as condições neutras retornaram ao Pacífico.

2) Como o fim do El Niño influencia o período chuvoso do Brasil? Qual a previsão climática para os próximos meses?

Previsão climática para o próximo trimestre, sem El NIño.

Previsão climática para o próximo trimestre. Elaboração: Lapis.

O período de chuvas regulares, na maioria das regiões brasileiras, inicia com a chegada da primavera, em setembro, e se estende pelo verão, que vai de dezembro a março. O verão é o período mais chuvoso do ano, em quase todo o País (Amazônia e região Centro-Sul).

Apenas no Nordeste, o regime de chuvas é um pouco diferente, pois normalmente ocorre de fevereiro a maio, no Semiárido brasileiro, e de maio a agosto, no Litoral da região.

O meteorologista Humberto Barbosa, do Lapis, explica que mesmo com o fim do El Niño, o clima do Brasil continua como se estivesse sob influência do fenômeno. “Apesar de o El Niño ter acabado, a atmosfera ainda demora um pouco para mudar, respondendo como El Niño até parte da primavera de 2019”, destacou.

Como consequência, haverá um padrão típico de El Niño até outubro deste ano, com previsão de chuva acima da média no Centro-Sul do Brasil, embora a precipitação não aconteça de forma contínua.

Essa situação já foi observada em 2005. Naquele ano, apesar do fim de um El Niño, ainda no primeiro semestre, seus efeitos foram registrados até o início da primavera

De acordo com o Lapis, a previsão climática sazonal para as regiões brasileiras, no próximo trimestre, é a seguinte:

Nordeste. Nessa região, o período da estação chuvosa já terminou, tanto no Semiárido quanto no Litoral. A partir de setembro, predomina seca e temperaturas mais altas que o normal. Na área sul da região, com destaque para o estado da Bahia, os volumes de chuvas esperados estarão abaixo da média histórica, em outubro e novembro.

Para uma análise completa sobre a seca e o clima no Nordeste brasileiro, incluindo a influência dos oceanos, a desertificação e os impactos das mudanças climáticas, indicamos a leitura do Livro “Um século de secas”, da Editora Chiado (Portugal). Para conhecer o Livro, acesse esta página.

Norte. Nessa região, em setembro, haverá chuvas em torno da média histórica para o período. Apenas no noroeste da Amazônia, a previsão é de chuvas acima da média, durante o mês.

Em outubro e, principalmente, em novembro, as chuvas estarão muito abaixo do normal, com predomínio de estiagem e aumento nas temperaturas. Os períodos de estiagem costumam aumentar o risco de incêndios florestais na região. Leia mais sobre as queimadas na Amazônia, neste post.

Centro-Oeste. Na região central do Brasil, em setembro, as chuvas serão de normal a abaixo da média, com tendência para ondas de calor frequentes, entre setembro e outubro.

Com as chuvas concentradas no Sul, este ano elas irão demorar mais a se regularizar no Centro-Oeste. Somente a partir de outubro, as chuvas ocorrem de forma mais frequente, ficando de normal a acima da média na região.

Sudeste. Em setembro, as chuvas serão abaixo da média na região. A previsão é de tornarem-se mais frequentes somente a partir de outubro, ficando acima da média em novembro, em praticamente todo o Sudeste.

Sul. A previsão é de chuvas acima da média na região, no próximo trimestre, especialmente em setembro e outubro. Mas não são esperados volumes extremos de chuvas, como normalmente ocorre em períodos de El Niño Clássico. Mostramos neste post a diferença entre El Niño Clássico e El Niño Modoki.

Embora a atmosfera continue respondendo como El Niño, com temperaturas acima da média até setembro, podem ocorrer novas ondas de frio na região.

3) Como ficará o fenômeno El Niño Oscilação Sul, no verão de 2020?

Tendências de El Niño em 2020

Tendências do fenômeno El Niño, até maio de 2020. Fonte: NOAA e CPC.

A imagem acima mostra tendências para as condições de La Niña (azul), neutralidade (cinza) e El Niño (vermelho), para o restante de 2019 e início de 2020.

No mês de julho de 2019, o índice Niño 3.4, principal parâmetro utilizado pelos para monitorar o fenômeno El Niño Oscilação Sul, estava 0,4 °C acima da média histórica. Foi a primeira vez, desde setembro do ano passado, que o indicador voltou a ficar abaixo do limiar de El Niño, que é maior ou igual a 0,5 °C.  

A atual condição do Pacífico tropical indica que voltamos às condições de neutralidade (ou seja, nem o El Niño nem o La Niña estão presentes). Considera-se a condição de neutralidade quando a temperatura superficial do Pacífico está em torno da média (na faixa entre +0,5 e -0,5°C).

Para o verão de 2020, os analistas da NOAA indicam situação de neutralidade do fenômeno no oceano Pacífico tropical, com probabilidade de 50 a 55% de permanecer nessa condição.

Com o fim do El Niño, as temperaturas não ficarão tão acima do normal quanto no verão passado.

4) Qual a chance de o El Niño voltar no verão ou outono de 2020?

É possível que um El Niño, encerrado no inverno, retorne no verão seguinte. Mas de acordo com os analistas da NOAA, o retorno do El Niño não será o resultado mais provável.

De acordo com os atuais prognósticos, o El Niño ocupa o segundo lugar como maior probabilidade de voltar no próximo verão ou outono, com chance de apenas 30%.

A chance maior é de as regiões central e leste do oceano Pacífico Equatorial continuarem em condição de neutralidade, com probabilidade de 50 a 55%.

Embora a possibilidade de La Niña no verão tenha aumentado, chegando a 15% no alto verão, ainda é muito maior a chance de neutralidade. Ainda há muita incerteza e uma definição melhor do cenário somente será possível após a atualização das condições de tempo na primavera.

5) Com o Pacífico neutro, prevalecem as condições meteorológicas normais em todo o mundo?

Um retorno à neutralidade do El Niño Oscilação Sul significa que não haverá a influência notavelmente ativa de um El Niño ou La Niña sobre o clima das regiões do Planeta. Mas a condição neutra do fenômeno não quer dizer, necessariamente, chuvas e temperaturas em torno da média. O comportamento da atmosfera também depende de outras condições.

No Brasil, com a ausência de um El Niño ou La Niña, uma das principais influências será a temperatura das águas superficiais do Atlântico Sul.

Caso as águas do Atlântico Sul estejam aquecidas, o cenário será favorável às chuvas no Nordeste brasileiro. Do contrário, se houver o seu resfriamento, a tendência será predomínio de secas na região. Mais adiante, falaremos com mais detalhes sobre as projeções para o Atlântico Sul, para o verão de 2020.

Além disso, como já explicamos acima, até o final do inverno de 2019, que termina em setembro, e durante parte da primavera, a tendência é que a atmosfera continue respondendo às condições de El Niño.

As condições meteorológicas de El Niño beneficiam diversos ramos da economia e da indústria, por trazerem ventos mais fortes para a costa do Nordeste.

É o caso da Alta Subtropical do Atlântico Sul (ASAS), um sistema de alta pressão atmosférica, que se movimenta sobre o oceano Atlântico Sul, a 6 km de altura, em relação à superfície.

Esse sistema causa a subsidência do ar, ou seja, permite que os ventos das camadas mais altas da atmosfera desçam para as camadas mais baixas, favorecendo a geração de energia eólica e solar. Para mais informações sobre a energia eólica no Brasil, recomendamos a leitura deste post.

Pela qualidade dos ventos no Nordeste, na última segunda-feira, dia 26 de agosto, a produção de energia eólica no Nordeste bateu um novo recorde, com produção diária que atendeu 89% da demanda do Nordeste.

Atualmente, os ventos são o segundo recurso mais utilizado para a geração de energia elétrica no Brasil, com mais de 85% da produção concentrada no Nordeste.   

Quando o centro da ASAS fica próximo da costa de parte do Sudeste e do Nordeste, impede a formação de nuvens de chuva, o número de horas de Sol forte aumenta e os dias ficam mais quentes.

Assim, a produção de energia solar também é beneficiada, podendo ser alternativa à geração de energia hidrelétrica, reduzida com a estiagem nas duas regiões.

6) Qual a previsão climática para as regiões brasileiras, no verão de 2020?

Em 2019, com um El Niño Modoki em formação, a chuva foi mais frequente no Centro-Sul do Brasil, enquanto foi abaixo da média no Norte e no Nordeste brasileiro. Leia este post para entender como foi o El Niño, em 2019.

Para o verão de 2020, a NOAA indica neutralidade. Segundo o meteorologista Humberto Barbosa, essa condição do Pacífico favorece chuvas e temperaturas normais, em torno da média histórica, nas regiões brasileiras.

Todavia, o especialista recomenda cautela em relação a esse padrão de normalidade climática. Em geral, a condição neutra é influenciada por vieses quentes ou frios do Pacífico.

De acordo com a NOAA, como desde agosto de 2019, o oceano Pacífico tem ficado um pouco mais frio que o normal, a tendência é de que tenhamos um verão com características típicas de La Niña.

Assim, ao contrário de 2019, esperam-se chuvas mais regulares no Centro-Norte do Brasil, durante o próximo verão. A expectativa é de chuvas mais bem distribuídas no Nordeste, a partir de fevereiro, além da região Norte e dos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.

Já na região Sul, principalmente no Rio Grande do Sul, bem como em São Paulo e no Mato Grosso do Sul, a previsão é de chuvas irregulares, com períodos de estiagens.

Já que a umidade estará mais concentrada entre o Centro-Norte do País, a falta de chuvas poderá ocorrer no Sul, sobretudo no fim do verão e início do outono de 2020.

Com o padrão de neutralidade do fenômeno El Niño e La Niña, o período chuvoso na primavera e verão 2019/2020 pode ser parecido com o que ocorreu em 2005/2006.

As chuvas chegam logo no início do plantio. Serão abundantes e bem distribuídas na região central do Brasil, favorecendo a safra de verão. Porém, durante o verão, podem ocorrer chuvas em excesso e prejudicar o desenvolvimento de algumas lavouras no Brasil central.

Essa previsão climática indica produtividade abaixo da média no Sul do País, pois não são esperadas chuvas abundantes e bem distribuídas para a região. Os produtores devem esperar os próximos prognósticos, a partir da definição do tempo na primavera.

Na região do Matopiba, com a neutralidade do Enso no oceano Pacífico, espera-se normalidade climática na primavera e no verão. O Matopiba é a área de confluência dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, considerada a nova fronteira agrícola do País. Para conhecer melhor a região, acesse este post

A previsão é de chuvas regulares nos estados de Matopiba, já a partir de novembro. As chuvas acima da média na região irão favorecer o desenvolvimento das lavouras e um bom resultado na colheita.

7) Como o oceano Atlântico vai influenciar o clima nos próximos meses?

No período de setembro a dezembro, a temperatura das águas superficiais do oceano Atlântico Sul estará em condição de neutralidade, com algumas áreas mais frias.

Já de dezembro a fevereiro, primeiros meses de verão, o predomínio é de temperaturas normais ou em torno da média, nessa área do Atlântico.

Segundo o meteorologista Humberto Barbosa, do Lapis, essa condição faz com que o Atlântico Sul não tenha influência marcante sobre o clima das regiões brasileiras, especialmente no Nordeste.

Com o Atlântico Sul em condição de neutralidade, será a temperatura do oceano Pacífico central e leste que determinará as condições climáticas no Brasil.

Nesse caso, pelas projeções elaboradas até agora, tudo indica que o clima brasileiro será influenciado por condição de neutralidade do oceano Pacífico, no próximo verão. Como explicamos acima, é possível que a condição neutra do Pacífico se aproxime de uma La Niña.

Conclusão

Acredito que você deve estar sonhando com a volta do El Niño ou do La Niña, a depender da região brasileira onde mora e dos seus interesses com a previsão climática.

O fato é que ainda falta bastante tempo para reduzirmos as incertezas das previsões e há muitos resultados possíveis com as condições atuais.

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COMO CITAR ESTE ARTIGO:

LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].

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