Uma nova pesquisa do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), baseada em dados de satélites, explica qual de fato pode ser a origem para um volume tão grande de fumaça em Brasília (DF), nos últimos dias.
No estudo do Laboratório Lapis, feito a partir da análise de imagens diárias de satélites do PlanetScope, observou-se uma sequência de queimadas provocadas em vários pontos de todo o Distrito Federal (e não apenas em Brasília), desde o início de setembro.
"A capital do Brasil de fato está em chamas desde o início de setembro, e não apenas nos últimos três dias, quando os incêndios florestais no Parque Nacional de Brasília chamaram mais atenção", ressalta Humberto Barbosa, fundador do Laboratório Lapis e responsável pelo estudo.
Desde o dia 15 de setembro, a fumaça em Brasília tem sido atribuída aos incêndios florestais no Parque Nacional de Brasília. Porém, a quantidade de focos naquele local não explica o que de fato está acontecendo. Até porque parte dos incêndios no Parque já foram controlados, nos últimos dias, pelos bombeiros e brigadistas.
“Na pesquisa, as imagens mostram linhas de fogo, não é algo pontual, não é algo considerado normal. São vários incêndios começando ao mesmo tempo, em locais diferentes do Distrito Federal, desde o início de setembro. Claramente, não são incêndios acidentais ou o fogo de uma queimada que se alastrou, são incêndios provocados”, explica Humberto.
O pesquisador destaca que nos dias 15 e 16 de setembro, vários focos de incêndios começaram em diferentes pontos do Distrito Federal, principalmente no Parque Nacional de Brasília, sugerindo a possibilidade de uma ação coordenada. "Não é um incêndio com o fogo se alastrando a partir de um foco, mas são vários incêndios começando em locais diferentes, ao mesmo tempo", pontua Humberto.
Veja na imagem de satélite do Planet Brasília tomada pela fumaça dos incêndios florestais.
Humberto ressalta que toda aquela fumaça em Brasília não tem origem apenas no fogo do Parque Nacional, mas em áreas de Cerrado e de matas de galeria. Mata de galeria é uma área florestal formada ao longo de rios e córregos pequenos, formando corredores fechados sobre os cursos d'água.
No estudo do Laboratório Lapis, chama-se atenção para incêndios florestais recorrentes no Campo de Instrução de Formosa, durante todo o mês de setembro. Essa é uma área militar preservada, na fronteira do Distrito Federal com Goiás, que tem sido foco de vários incêndios florestais neste mês de setembro.
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O satélite Super Dove, da constelação PlanetScope, flagrou a área destruída pelo fogo no Parque Nacional de Brasília (DF). A imagem destaca a dimensão da destruição da cobertura florestal (em tons de cinza escuro, na imagem de satélite), após o incêndio florestal de grandes proporções, que começou por volta das 11h30 do domingo, dia 15 de setembro. A suspeita é de incêndio intencional.
Você pode observar na imagem uma densa e escura coluna de fumaça saindo do Parque, também conhecido como Água Mineral. As chamas chegaram perto do reservatório de Santa Maria, o segundo maior do Distrito Federal e que abastece o Plano Piloto, a área central de Brasília. Santa Maria integra o sistema Torto/Santa Maria, que abastece cerca de 20% da população da capital do Brasil.
O incêndio atingiu uma área de cerca de 3 mil hectares do Parque. Um hectare equivale a aproximadamente um campo de futebol profissional. O Parque de Brasília é uma unidade de conservação criada em 1961, com cerca de 42 mil hectares, protegendo espécies animais e vegetais do Cerrado. A maior queimada já registrada foi em 2010, quando consumiu 15 mil hectares do local.
O estudo do Laboratório Lapis mostrou que os incêndios florestais deste no Parque Nacional de Brasília começaram desde o dia 04 de setembro. A partir desta data, imagens de satélites mostraram fumaça recorrente no local, oriunda dos focos.
De acordo com Humberto, essas imagens do satélite de alta resolução permitem estimar a dimensão da área afetada pelo fogo. Esses dados de alta tecnologia ajudam a mensurar com precisão áreas de degradação ambiental nas regiões brasileiras, especialmente do rastro de destruição deixado pelos incêndios e queimadas.
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O estudo do Laboratório Lapis identificou cicatrizes dos incêndios florestais em áreas do Distrito Federal, como mostram imagens de satélite do Planet. Você pode observar, na composição acima, a imagem da cobertura vegetal de uma área do Parque Nacional de Brasília.
As áreas em amarelo e vermelho representam área construída ou onde houve perda de cobertura vegetal. O produto Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) foi gerado com dados de satélite do Planet. Ao comparar as duas imagens, você pode identificar o enorme dano causado à cobertura vegetal pelos incêndios recentes.
A cicatriz é o aspecto que fica na paisagem após a queimada, com a presença de cinzas e danos na vegetação. Costuma aparecer, na imagem de satélite, em colorações roxa, preta ou marrom escura.
O mapeamento dessas cicatrizes, em áreas florestais, é essencial para avaliar a extensão e a gravidade dos danos causados pelos incêndios.
A grande seca que atinge desde a Amazônia até o Centro-Sul se destaca no debate público. Junto com ela, ondas de calor, incêndios florestais e riscos ao abastecimento de água à população. Desde o mês de abril, o Laboratório Lapis monitora diariamente a situação da seca. Recentemente, desenvolveu uma metodologia para monitorar os seus impactos no nível dos rios e reservatórios.
Uma das regiões afetadas pela seca intensa é o Distrito Federal, onde um verão seco pode prejudicar todo o abastecimento de água. Os reservatórios do Descoberto e Santa Maria, juntamente com o lago Paranoá, são os mais importantes do local.
O gráfico abaixo mostra o número de dias secos no Distrito Federal, afetado pela seca desde o fim de abril.
De acordo com Humberto, se não chover o suficiente na estação chuvosa de 2024-2025, no Distrito Federal, há razões para se preocupar.
"Este ano, já são 148 dias sem chuvas, uma seca parecida com a 1963 (quando houve registro de 163 dias sem chuvas). Nos últimos anos, extremos climáticos pioraram o sobe e desce do nível do reservatório de Santa Maria”, explica o meteorologista.
Só o reservatório Descoberto abastece cerca de 65% da população de Brasília. Santa Maria integra o sistema Torto/Santa Maria, que abastece cerca de 20% da população da capital do Brasil. Já o Lago Paraná é um reservatório de usos múltiplos.
De acordo com o meteorologista Humberto Barbosa, fundador do Laboratório Lapis, se não chover o suficiente na estação chuvosa de 2024-2025, há razões para se preocupar, porque este ano está quase tão seco quanto em 2022.
O gráfico abaixo mostra a série temporal da área total de água superficial, nos últimos cinco anos. O detalhe mais importante está nas flutuações entre um ano e outro, variando de 8 a 13 km2.
A superfície coberta por água muda de acordo com a condição climática, sendo alguns anos mais secos e outros mais chuvosos. Nos últimos anos, extremos climáticos pioraram o sobe e desce do nível dos reservatórios. Imagens de satélite do PlanetScope permitem comparar as variações sazonais do manancial do Rio Descoberto, no período de novembro de 2022 e agosto de 2024.
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LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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