A atual seca na Amazônia brasileira é o quarto evento climático extremo registrado, em apenas duas décadas. Somente neste século, foram quatro períodos de secas extremas: 2005, 2010, 2015-2016 e 2023-2024. O levantamento foi feito pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis) especializado no monitoramento ambiental e climático por satélite, especialmente de secas extremas.
“É totalmente incomum essas secas extremas na Amazônia. Era esperado que um desses eventos severos de seca ocorresse apenas uma vez a cada século na região. Observe que nos últimos 20 anos, duas dessas secas extremas se prolongaram por dois anos, o que é totalmente atípico para a região”, diz o meteorologista Humberto Barbosa, fundador do Laboratório Lapis.
Desde setembro de 2023, uma severa seca atinge a Amazônia. A crise é mais extrema no Amazonas, que enfrenta pressões crescentes pelo desmatamento, principalmente na área mais ao sul. Apesar da degradação, o estado possui a maior proporção de cobertura vegetal e cursos d’água preservados no País.
Na região amazônica, há duas estações ao ano: a seca e a chuvosa. A estiagem mais aguda começou no fim do período seco de 2023, que ocorre entre maio e outubro, e se prolongou pelo período seco deste ano.
“Ainda não sabemos se a atual seca vai bater o recorde do evento extremo de 2015-2016”, explica Humberto.
O nível crítico dos rios da Amazônia é um grande problema para a população, pois o transporte e as atividades econômicas dependem desses mananciais. Os rios também são fontes de alimentação para as comunidades indígenas.
Atualmente, a seca severa limita o fluxo de embarcações pelos rios, principal meio de transporte em algumas áreas da região. Desse modo, os impactos da atual seca ainda não foram devidamente dimensionados, tanto para o bioma quanto para as comunidades.
Imagens do satélite Landsat, permitem comparar o atual nível do Rio Negro e do Rio Amazonas com a situação desses mananciais em 1985. Nas imagens, chama-se atenção para a expansão urbana da cidade de Manaus, nas últimas quatro décadas.
Na sexta-feira, dia 04 de outubro deste ano, o nível do Rio Negro caiu para menos de 13 metros, no Porto de Manaus (AM), o menor nível medido em 120 anos.
Em outro extremo, seu recorde máximo ocorreu durante a enchente sem precedentes de junho de 2021, atingindo 30 metros. O Rio Negro drena cerca de 10% da bacia amazônica, sendo o sexto maior do mundo em volume de água.
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Imagens do satélite PlanetScope permitem comparar a atual situação do nível do Rio Negro com o ano de 2022. Atualmente, o Amazonas enfrenta um cenário climático crítico, em razão da combinação de uma seca prolongada com incêndios florestais.
De acordo com o Sistema Integrado de Informações sobre Desastres Naturais (S2ID), da Defesa Civil nacional, cerca de 75% dos municípios do estado do Amazonas já decretaram Situação de Emergência, por enfrentar seca ou estiagem.
A Amazônia já enfrentou oito ondas de calor, somente este ano, o que também é incomum. No Brasil, todos os meses decorridos deste ano tiveram temperaturas acima da média histórica, em relação ao período 1991-2020.
Os gráficos abaixo mostram as ondas de calor no norte do Amazonas, uma das áreas com maior risco climático.
De acordo com Humberto Barbosa, responsável pelo estudo, outros fatores contribuem para esses extremos de calor, como o aumento da temperatura global da superfície terrestre e dos oceanos.
O ano de 2023 foi o mais quente da história do Planeta e o mais quente da série histórica do Brasil, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM). Uma onda de calor corresponde a um período de alguns dias com temperaturas máximas superiores à média esperada para a época.
Hoje, já é possível estimar como a mudança climática alterou as temperaturas diárias locais, em qualquer local do País. No mapa do Índice de Risco Climático (IRC), as áreas em vermelho indicam temperaturas acima do normal, que coincidem com áreas com maior degradação das terras (Veja o mapa acima). As temperaturas médias vêm do modelo de previsão da NOAA.
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Há uma estreita relação entre secas, destruição da floresta e saúde pública, principalmente em razão do papel dos rios para o suprimento de água e alimentos à população. Neste post, destacamos como a qualidade da água já está comprometida em alguns rios da Amazônia, como no Tapajós (PA). Nesses mananciais, há predomínio de algas e cianotoxinas prejudiciais à saúde humana e animal, em razão dos baixos volumes de água.
Poucas pesquisas haviam analisado como as secas aumentam a degradação das terras na Amazônia. Um estudo publicado pelo Laboratório Lapis concluiu que as secas prolongadas aumentaram o ritmo do desmatamento, nos últimos anos. Isso acelerou a degradação das terras na bacia amazônica.
De acordo com o estudo, cerca de 13% da bacia amazônica se tornou degradada, apenas nas últimas duas décadas. O sul e sudeste da Amazônia são as áreas mais afetadas pelo desmatamento e queimadas na região. Há risco para savanização dessas áreas. Acesse o artigo completo.
De junho de 2023 a junho deste ano, a Amazônia estava sob influência do El Niño, que reduz suas chuvas. Agora, ao contrário, a região está sob a influência do aquecimento anormal do Atlântico Norte, que costuma trazer ventos secos para o bioma, provocando estiagens mais fortes do que as sazonais.
As imagens de satélite do PlanetScope mostram a situação da seca no rio Tefé, no município de Tefé (AM), em novembro de 2023. É possível comparar com a imagem que mostra o mesmo rio ainda cheio, em julho do ano passado.
Para combater a seca extrema na Amazônia e seus efeitos devastadores, é fundamental adotar medidas rigorosas para coibir o desmatamento e o garimpo ilegal.
Há ainda a construção de grandes empreendimentos, como hidrelétricas e estradas, que aumenta drasticamente a degradação do bioma. É o caso da atual construção da BR-319, que a qualquer momento pode ser iniciada, aumentando o arco do desmatamento na região.
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LETRAS AMBIENTAIS. [Título do artigo]. ISSN 2674-760X. Acessado em: [Data do acesso]. Disponível em: [Link do artigo].
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